A ANTROPOFAGIA VISUAL DE CIDADE INVISÍVEL

Autores

  • Paulo Custódio de Oliveira Universidade Federal da Grande Dourados
  • Christiane Silveira Batista Universidade Federal da Grande Dourados

Palavras-chave:

Manifesto antropófago, Antropofagia cultural, Cidade invisível, Folclore, Audiovisual

Resumo

O Manifesto antropófago foi um documento, uma espécie de carta aberta, publicado em 1928 por Oswald de Andrade. Nele, o poeta fazia um convite aos artistas brasileiros para exercerem sua originalidade e criatividade de uma maneira inteiramente nova. Esse esforço visava colocar a arte brasileira em patamares confortáveis no cenário internacional. O sentido da palavra está nas suas duas partes gregas: anthropo, que quer dizer homem (ser humano), e phagía, que significa comer. A prática de comer carne humana foi constatada nos atos ritualísticos de comunidades indígenas, nos quais uma pessoa ou um grupo acredita que ao comer a carne de um outro homem adquire as suas habilidades. Assim, Oswald de Andrade se apropriou de um termo depreciativo para as origens das comunidades pré-cabralinas brasileiras e tornou seu sentido cultural, ao sugerir que mediante a absorção de outras artes e tradições estrangeiras a nossa arte nos tornasse esteticamente fortes. Destarte, esse é um conceito que ainda reverbera nos dias de hoje. Exemplo disso é a série Cidade invisível (2021), criada por Carlos Saldanha, em que são exploradas nossas raízes míticas por meio de lendas folclóricas em uma linguagem tipicamente hollywoodiana. O formato midiático incute ares contemporâneos e urbanos aos personagens, fazendo-os corporificar uma trama policial dramática em que a jornada de um herói, o Curupira, mescla-se à crítica sobre o modo como são tratadas as reservas naturais em nosso país. Esse diálogo entre folclore nativo e estética hollywoodiana, entre tradição oral e audiovisual, mostra que os processos de criação e as formas de recepção das obras de arte não têm limites para o redimensionamento, que se afigura perpétuo. Afirma-se que a série é antropofágica porque retoma um tema tipicamente brasileiro, subvertendo sua representação tradicional, e ressignifica-o por meio de uma produção audiovisual que interage com esferas culturais e econômicas. O processo revela a capilaridade do artefato estético, que se liga tanto ao modo de ser contemporâneo quanto à concepção de ser contemporânea. Isso implica dizer que além de reproduzir uma vida e uma sociedade de nosso tempo, séries como essa, produzidas especificamente para as plataformas de streaming, influenciam a forma como essa sociedade antropofagicamente se constitui.

Biografia do Autor

Paulo Custódio de Oliveira, Universidade Federal da Grande Dourados

Doutor em Letras pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), professor adjunto na Faculdade de Comunicação, Artes e Letras (FACALE) da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) e coordenador do InterArtes/UFGD.

Christiane Silveira Batista, Universidade Federal da Grande Dourados

Mestra em Letras pela Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), Técnica em Assuntos Educacionais na mesma instituição e pesquisadora do InterArtes/UFGD.

Referências

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Publicado

19.05.2024

Como Citar

Custódio de Oliveira, P., & Silveira Batista, C. (2024). A ANTROPOFAGIA VISUAL DE CIDADE INVISÍVEL. Revista Coletivo Cine-Fórum, 1(1), 6–17. Recuperado de https://revistacoletivocine.xyz/index.php/cineforum/article/view/1

Edição

Seção

Artigos