RECOCINE | v. 2 - n. 3 | set-dez | 2024 | ISSN: 2966-0513  
Leonardo Augusto de Jesus  
Doutor em Artes Visuais / Imagem e Cultura pelo PPGAV/EBA/UFRJ (2023). Pesquisador-  
organizador do NEsCaFe - Núcleo de Estudos de Carnavais e Festas. Possui Mestrado em História  
da Dramaturgia - Universidad de Alcalá (2012), diploma revalidado no Brasil pelo Mestrado em  
Artes da Cena da Universidade Federal do Rio de Janeiro (2018). Graduado em Artes Cênicas  
Cenografia pela EBA/UFRJ (2010). Tem experiência na área de Artes, com ênfase em Teatro  
(Cenografia e Figurino) e Carnaval. No carnaval, atuou profissionalmente em diversas etapas da  
produção dos desfiles: projeto e decoração de alegorias, confecção de fantasias de alas e  
composições e como componente de comissões de frente.  
PhD in Visual Arts / Image and Culture from PPGAV/EBA/UFRJ (2023). Researcher and organizer at  
NEsCaFe – Center for Studies on Carnivals and Festivities. Holds a Master’s degree in Dramaturgy History  
from Universidad de Alcalá (2012), with its diploma recognized in Brazil by the Master’s in Performing Arts  
at the Federal University of Rio de Janeiro (2018). Graduated in Scenic Arts Set Design from EBA/UFRJ  
(2010). Has experience in the field of Arts, with an emphasis on Theater (Set Design and Costume Design) and  
Carnival. In Carnival, has worked professionally in various stages of parade production: design and decoration  
of floats, creation of costumes for parade wings and performers, and as a member of front commission teams.  
.
Este artigo passou por avaliação por pares cega e software anti-plágio.  
LICENÇA ATRIBUIÇÃO NÃO COMERCIAL 4.0 INTERNACIONAL CREATIVE COMMONS CC BY-NC  
O TAMBOR DE CRIOULA EM FIGURINOS CARNAVALESCOS  
RESUMO  
Este artigo tem por objetivo aprofundar o relato das pesquisas artísticas e acadêmicas realizadas durante  
o processo de criação das visualidades apresentadas no desfile do GRES. Acadêmicos do Engenho da  
Rainha durante o carnaval de 2022. Naquele ano, desenvolvi para a agremiação o enredo Punga,  
Crioula!, cuja temática abordava o tambor de crioula inserido no universo cultural e religioso de São  
Luís do Maranhão. Uma primeira e breve versão deste estudo já foi apresentada por mim  
anteriormente; no entanto, desta feita, apresento um relato mais detalhado e com recorte específico na  
criação e produção das fantasias das alas. Detalho, aqui, o processo de pesquisas artística de materiais e  
técnicas de beneficiamento têxtil aplicadas às fantasias de modo a torná-las adequadas à representação  
do enredo proposto. Apresento, ainda, o roteiro geral do desfile, documento enviado aos julgadores da  
Liga LIVRES/RJ e que até o momento ainda não foi tornado público, apesar de sua extrema relevância  
para os desdobramentos visuais das imagens literárias constantes da sinopse do enredo. O projeto contou  
com a participação colaborativa de alunos da Pós-graduação em Figurino e Carnaval da Universidade  
Veiga de Almeida durante as etapas de criação das fantasias; no processo de produção, também  
colaboraram estudantes das graduações em Artes Cênicas Cenografia e em Artes Cênicas –  
Indumentária da Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro. O trabalho realizado  
comprovou a função significante dos figurinos criados para as alas em um desfile que consagrou a  
agremiação como campeã do Grupo B do carnaval carioca em 2022.  
Palavras-chave: Tambor de crioula. Figurino. Fantasia. Escola de samba. Processo de criação.  
THE CREEOL DRUM IN CARNIVAL COSTUMES  
ABSTRACT  
This article aims to deepen the report of the artistic and academic researches carried out during the  
creation process of the images presented in the parade of the GRES. Acadêmicos do Engenho da Rainha  
during the carnival in 2022. That year, I developed the theme Punga, Crioula! for that samba school,  
which addressed the creeol drum inserted in the cultural and religious universe of São Luís. A first –  
and brief version of this study has already been presented by me previously; however, this time, I  
present a more detailed report with a specific focus on the creation and production of the costumes. Here  
I detail the process of artistic research of materials and textile processing techniques applied to costumes  
in order to make them suitable for representing the proposed theme. I also present the general script of  
the parade, a document sent to the judges of Liga LIVRES/RJ and which has not yet been made public,  
despite its extreme relevance for the visual developments of the literary images contained in the  
synopsis. The project included the collaborative participation of postgraduate students in Costume  
Design and Carnival at Universidade Veiga de Almeida during the stages of creating the costumes; in  
the production process, students from the graduation courses in Performing Arts Scenography and  
Performing Arts Costume at the School of Fine Arts of the Federal University of Rio de Janeiro also  
collaborated. The work carried out proved the significant role of the costumes created for the parade  
that established the samba school as champion of Group B of the Rio carnival in 2022.  
Keywords: Creeol drum. Theater costume. Carnival costume. Samba school. Creation process.  
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INTRODUÇÃO  
Em estudo anterior, relatei o processo de desenvolvimento do enredo Punga, Crioula!,  
apresentado pelo GRES. Acadêmicos do Engenho da Rainha no carnaval carioca de 2022. A  
narrativa carnavalesca, que abordava o contexto cultural e religioso ludovicense com destaque  
para o tambor de crioula do Maranhão, foi construída a partir da pesquisa de campo realizada  
na Casa do Tambor, em São Luís, juntamente com levantamento bibliográfico, coleta de dados  
sobre o processo de patrimonialização da manifestação e pesquisas artísticas relativas à criação  
das visualidades carnavalescas1.  
Neste artigo, apresento outro relato do mesmo processo, com ênfase na criação e  
produção dos figurinos das alas apresentadas no desfile. Tal escolha se justifica pela relevância  
das alas para a representação visual do enredo a ser desfilado. As sete páginas da sua sinopse  
foram desdobradas imageticamente em 17 alas, número muito superior à quantidade de  
alegorias apenas duas e demais segmentos do desfile, composto ainda pela comissão de  
frente, dois casais de mestre-sala e porta-bandeira, bateria e sua rainha, três musas e um muso,  
seis destaques de chão, além dos destaques principais (um em cada alegoria) e dois grupos de  
composições no primeiro carro alegórico.  
Ainda que não se possa tomar o exemplo acima como referência matematicamente exata  
para a comparação proporcional entre a quantidade de alas e demais segmentos, a simples  
observação de qualquer desfile de Escola de Samba comprova que as fantasias das alas são as  
mais numerosas dentre as visualidades apresentadas nos préstitos do carnaval carioca.  
Por outro lado, há que se considerar que, desde os anos 1960, as Escolas de Samba do  
Rio de Janeiro atravessam um processo de teatralização e adquirem cada vez mais  
características cênicas. Patrice Pavis (2008) afirma o figurino teatral como sistema significante:  
todos os seus elementos operam como signos oferecidos ao olhar do espectador para a  
compreensão adequada da fábula. Para ele, o figurino somente adquire sentido no corpo do  
intérprete e deve ser entendido em sua relação com este organismo vivo. Desta forma, é a partir  
do seu funcionamento em cena que se pode avaliar a qualidade de um figurino, conforme ensina  
Elizabeth Filipecki: “O figurino serve ao intérprete que, por sua vez, atribui significado ao traje”  
(2017, p. 147).  
Do mesmo modo, as fantasias se transformam em coberturas têxteis sob as quais os  
corpos desfilantes se relacionam entre si e com os espectadores, despersonalizam-se para se  
1 Para melhor entendimento do processo de desenvolvimento do enredo, vide JESUS, Leonardo Augusto de. Desdobramentos lítero-visuais da  
carnavalização do tambor de crioula. In: À.FLOR.DA.PELE: Encontro ANPAP Sudeste de Jovens Pesquisadores 2024. Niterói: PPGCA, 2024.  
p.  
144-156,  
Disponível  
em:  
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transformarem em portadores de signos visuais que orientam o público na compreensão da  
narrativa carnavalesca.  
Portanto, considerando a relevância das fantasias das alas dentre os diversos sistemas  
significantes que integram um desfile de Escola de Samba, apresento neste artigo um relato  
específico da pesquisa artística que conduziu a criação e a produção dos figurinos das alas que  
integraram o desfile do GRES. Acadêmicos do Engenho da Rainha no carnaval de 2022.  
O ENSINO EM ATELIÊ DE ESCOLA DE SAMBA  
Desde 2019, quando iniciei a carreira como carnavalesco de Escola de Samba nas  
divisões de base do carnaval carioca, estimulei o convívio e a participação de alunos na criação  
e na produção das visualidades dos desfiles. Inspirava-me na lição de Fernando Pamplona,  
carnavalesco e professor da Escola Nacional de Belas Artes (atual Escola de Belas Artes da  
UFRJ), pioneiro na experiência de introduzir estudantes nos fazeres artísticos do carnaval  
carioca, segundo Helenise Guimarães:  
Esta metodologia didática sem dúvida foi benéfica. A Escola de Belas Artes  
proporcionava aos seus alunos uma formaçao técnica e artistica especializada, que  
tambem incluia o conhecimento cultural. O trabalho prático no carnaval, fosse ele em  
decorações de ruas e bailes, fosse em Escolas de Samba enriquecia este aprendizado  
(...) (1992, p. 54-55).  
Assim, o projeto criativo das fantasias do desfile do GRES. Acadêmicos do Engenho da  
Rainha para o carnaval de 2022 contou com a participação de Carolina Campos e Felipe Cunha  
(assistentes do carnavalesco), Carolina Bianque e Leandro do Vale (desenhistas) e Dilza  
Ribeiro (modelista), para os quais lecionei na Pós-graduação em Figurino e Carnaval da  
Universidade Veiga de Almeida. Na etapa de produção dos figurinos das alas, juntaram-se aos  
trabalhos como estagiários voluntários os seguintes estudantes das graduações em Artes  
Cênicas com habilitação em Indumentária e Cenografia da Escola de Belas Artes da UFRJ:  
Átalo Willan Barreto dos Santos, Bruna da Silva Fernandes Murta, Carlos Eduardo Camilo de  
Almeida, Cíntia de Almeida Miranda, Felipe Eduardo Stein, Isabele Estevam dos Anjos Silva,  
Joyce Dias da Silva, Myllena Miranda Teixeira e Raquel Cruz Martins Ramos2.  
O ensino prático, tanto no projeto criativo, quanto em sua execução, aperfeiçoou o  
conhecimento teórico que cada participante já havia adquirido em sala de aula. Ademais,  
2
Raquel Martins fará sua estreia como carnavalesca do GRES. Acadêmicos da Abolição, que desfilará em 2025 na Série Prata, atual  
nomenclatura correspondente à terceira divisão dos desfiles no Rio de Janeiro.  
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possibilitou o contato e o aprendizado com artistas comunitários que dominam saberes e fazeres  
do mundo samba não difundidos academicamente.  
UM MÉTODO TEATRAL ADAPTADO AO CARNAVAL  
A produção de figurinos teatrais ou para outras práticas espetaculares é um processo  
transdisciplinar que envolve tanto aspectos teóricos quanto práticos. Neste processo, o  
figurinista pode se valer dos saberes de diferentes campos científicos, como História da Arte,  
História da Moda, Psicologia, Semiótica ou Semiologia, dentre outros, que fornecem uma base  
conceitual para entender como o vestuário comunica significados e como ele pode ser utilizado  
para reforçar a dramaticidade de uma encenação. Neste aspecto reside o principal desafio para  
o figurinista, segundo Samuel Abrantes (2017, p. 31): produzir sentidos ao materializar o texto  
dramático em objetos vestíveis, artísticos e funcionais.  
O processo inicia-se geralmente com a leitura, análise e decupagem do texto para que o  
figurinista compreenda a trama e suas temáticas, suas personagens, seu contexto histórico. A  
decupagem de uma obra teatral permite identificar as características essenciais que orientarão  
a criação dos figurinos na tarefa de materializar cada personagem diante dos olhos dos  
espectadores.  
No caso em tela, o texto a ser analisado não corresponde a uma obra dramática  
propriamente dita, destinada a ser representada materialmente por personagens com réplicas e  
que desempenham ações perante o espectador. Deve-se analisar a sinopse do enredo, peça  
literária que fundamenta todo o processo criativo e produtivo de um desfile de Escola de Samba.  
Compreendo o desfile como representação que opera uma relação entre o dizível e o visível3,  
para cujo desenvolvimento a sinopse do enredo assume relevância fundamental, por criar as  
imagens literárias que serão desdobradas visualmente no espetáculo, assim como na letra do  
samba-enredo.  
Portanto, faz-se necessário adaptar o método tradicional de criação de figurinos teatrais  
para as singularidades da narrativa lítero-visual carnavalesca. Neste sentido, vale lembrar a  
definição que oferece Pavis: decupagem refere-se a toda análise de um texto dramático que  
busque suas unidades e seu funcionamento, sendo “uma tomada de consciência do modo de  
fabricação da obra” que influi diretamente na produção de sentidos no espetáculo (2008, p. 86).  
A decupagem da sinopse não buscará identificar as funções actanciais de cada personagem –  
3
Adoto o pensamento de Rancière, para quem as práticas e representações ordenam as relações entre a ação e o saber e as relações entre o  
dizível e o visível, na qual a essência da palavra é dar a ver sob o regime de uma dupla retenção: por um lado, o visível retém a potência textual;  
por outro, a palavra institui uma determinada visibilidade, retendo a potência visual (2012, p. 127).  
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para empregar a terminologia proposta por Anne Ubersfeld (2013) mas será ferramenta útil  
para auxiliar o carnavalesco e os figurinistas a entender as necessidades específicas das  
fantasias de cada segmento.  
A decupagem de uma obra dramática costuma ser apresentada em uma tabela: na  
primeira coluna, constam os nomes das personagens; nas demais colunas, lançam-se as  
informações agrupadas conforme determinadas características, tais como: aparência física,  
personalidade, posição sócio-cultural, referências de vestuário e acessórios, dentre outras. O  
resultado da análise do texto da sinopse, de forma análoga, também costuma ser apresentado  
em uma tabela que se convencionou chamar como roteiro do desfile: documento que relaciona  
a sequência de segmentos e os significados que justificam a presença de cada visualidade em  
sua relação com o enredo. A tabela 1 reproduz o roteiro do desfile do GRES. Acadêmicos do  
Engenho de Rainha no carnaval de 2022, conforme disponibilizado aos julgadores da Liga  
LIVRES.  
Tabela 1 Roteiro Geral do Desfile da Acadêmicos do Engenho da Rainha, 2022.  
AGREMIAÇÃO: GRES. ACADÊMICOS DO ENGENHO DA RAINHA  
ENREDO: PUNGA, CRIOULA!  
Segmento  
Nome da Fantasia  
Significado e descrição da fantasia e participação no enredo  
(nº de componentes)  
PRIMEIRO SETOR: A DIÁSPORA JEJE MINA DO DAOMÉ AO MARANHÃO  
COMISSÃO DE FRENTE  
Punga!  
A comissão de frente pretende transmitir ao público a beleza rítmica  
(12 componentes)  
e coreográfica de uma roda de Tambor de Crioula é. Uma dança  
composta por "tambozeiros", homens que aquecem seus tambores  
no calor da fogueira. E as "coreiras", que são mulheres que entram  
na roda e dançam com movimentos típicos do festejo.  
Será apresentado esse festejo que foi trazido pelos nossos ancestrais  
africanos escravizados no Maranhão. Que foi uma forma de  
expressão sagrada, o ecoar do som dos tambores contatavam  
simbolicamente a resistência do nosso povo à escravidão.  
Sendo essa resistência, que nos dá força nos dias de hoje para que  
tenhamos voz e coragem para dançarmos e tocarmos livremente o  
Tambor de Crioula. Em 2007 se tornou patrimônio imaterial cultural  
do Brasil, e por isso é preservada com bastante afinco.  
Seguimos nessa luta com a força dos nossos ancestrais. E nada  
poderá calar a voz do povo Preto! (Texto do coreógrafo Jorge  
Amareloh)  
Primeiro casal de Mestre-  
sala e Porta-bandeira  
Da roda da saia à  
roda de samba  
O Tambor de Crioula integra a chamada família musical do Samba,  
que engloba as diversas formas de batucadas e umbigadas praticadas  
no Brasil, como Jongo, Caxambu, os Cocos do Nordeste, o Samba  
de Roda baiano, os Sambas Rurais paulistas, o Samba Urbano  
carioca, etc... Todas essas manifestações de matriz africana foram  
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perseguidas, discriminadas e marginalizadas, como aconteceu com  
o Tambor de Crioula. A fantasia do casal de Mestre-Sala e Porta-  
Bandeira remete aos primeiros sambistas, que persistiram em cantar  
e dançar o samba na Cidade de São Sebastião. A circularidade é  
outro ponto em comum a essas práticas culturais: tudo gira, tudo  
roda, tudo é dança e circular. Nos rodopios da Porta-bandeira, a roda  
da saia une simbolicamente o Tambor de Crioula do Maranhão e o  
Samba do Rio de Janeiro.  
Ala 1 Baianas  
(40 componentes)  
Povo Jeje Mina  
Representam a fé e a religiosidade dos habitantes do antigo Reino do  
Daomé, que foram explorados e sequestrados pelos portugueses para  
serem escravizados no Maranhão. O principal Vodun da nação Jeje  
é Dan, a serpente da vida, que mordeu a própria cauda para dar  
origem ao movimento de rotação e translação da terra. Em 1990, a  
Acadêmicos do Engenho da Rainha apresentou o enredo Dan, a  
Serpente Encantada do Arco-íris, com um samba antológico  
premiado com Estandarte de Ouro. Neste desfile, ao homenagear a  
nação Jeje, as baianas da Primeira Academia batem cabeça para  
todos os seus antepassados do Daomé ao Morro do Engenho.  
Ala 2  
Nochê Sobô Babadi Vodun feminino que rege os ventos, os raios e os trovões. O sopro  
A força dos  
ventos  
Toi Averekete  
de Nochê Sobô Babadi sobre o mar impulsionou os navios da África  
ao Brasil, ao mesmo tempo que amenizou as dores dos escravizados.  
Vodun relacionado ao mar e à pesca. Filho mais jovem de Sobô,  
intermedia a relação entre os voduns do céu e os voduns do oceano.  
No Maranhão, as cerimônias religiosas praticadas pelos  
escravizados em louvor a Averekete deram origem ao Tambor de  
Crioula.  
(30 componentes)  
Ala 3  
(30 componentes)  
Ala 4  
Diáspora no balanço Em Ouidah, principal cidade portuária do antigo Reino do Daomé,  
do mar  
foi construída a Porta do Não Retorno, último pedaço de solo  
africano pisado pelos escravizados antes do embarque. Dali, o povo  
Jeje Mina foi lançado ao mar de Averekete em uma diáspora forçada  
para a escravidão em São Luís do Maranhão.  
(16 componentes)  
Musa Patrícia Miranda  
Alegoria 1  
Riquezas de  
Averekete  
As águas que  
rodeiam a Ilha de  
Upaon-açu  
A arrebentação traz à Ilha de Upaon-Açu as riquezas do mar de  
Averekete.  
Fundada em uma ilha, as águas do mar assumiram importância  
relevante para cultura popular em São Luís. A alegoria representa as  
lendas e os mistérios que habitam as águas ludovicenses.  
Semi-destaque  
Débora  
Encantos marinhos Representa os encantos e mistérios do fundo do mar.  
Destaque  
Nilo Cesar Barbosa  
Encantamento de  
Dom Sebastião  
Diz a lenda maranhense que Dom Sebastião, Rei de Portugal, tornou-  
se um ser encantado após desaparecer na Batalha de Alcácer-Quibir.  
Seu reino está oculto no fundo do mar, próximo a São Luís, e seu  
navio nunca encontra a rota de volta a Portugal.  
Composições  
Composições  
Riquezas do fundo  
do mar  
Seres do fundo do  
mar  
Representam as riquezas do Reino de Dom Sebastião submerso nas  
águas litorâneas do Maranhão.  
Representam a fauna misteriosa que habita o Reino de Dom  
Sebastião submerso nas águas litorâneas do Maranhão.  
SEGUNDO SETOR: AFRICANIDADES NA CULTURA LUDOVICENSE  
Encantados do Mar O culto aos Encantados é uma parte importante do Tambor de Mina,  
principal religião de matriz africana no Maranhão. Tratam-se de  
espíritos de pessoas que não morreram, mas se encantaram –  
desapareceram misteriosamente, tornaram-se invisíveis ou se  
transformaram em animais, plantas ou seres mitológicos. Esta ala  
representa os espíritos de náufragos e desaparecidos em navegações  
que se encataram em uma simbiose com outros seres marinhos,  
como algas e estrelas-do-mar.  
Ala 5  
(20 componentes)  
Ala 6  
(21 componentes)  
Encantados da  
Floresta  
Representa os Encantados que integram a Família de Surrupira na  
Encantaria maranhense. Composta por índigenas e caboclos  
selvagens, que não gostam de contato com a civilização. Conhecidos  
como feiticeiros e "quebradores de demanda", foram cultuados na  
Casa das Minas como entidades de limpeza. Também são ligados ao  
Rei Sebastião e, portanto, relacionam-se ao mesmo tempo às águas  
do mar e às matas.  
Ala 7 Passistas  
(40 componentes)  
Encantados do Fogo Representa a Família de Encantados da Bahia, composta por  
caboclos farristas, sincretizados na umbanda com os Exus e as  
Pombogiras. Desde sua origem até os dias de hoje, o fogo é essencial  
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para a prática do Tambor de Crioula, afinado a fogo, tocado a  
murro, dançado a coice e chão”, como explica a fala popular. Para  
reforçar a simbologia do fogo, o acabamento de cada recorte de  
tecido vermelho que compõe a fantasia da ala foi realizado com  
selagem na chama de uma vela. Desta forma, a representação das  
labaredas em tecidos possui a lateral escurecida, marca do fogo que  
abre caminho para que a ala de passistas incendeie a Intendente  
Magalhães!  
Rainha de Bateria  
Fernanda Florentino  
Calor da Fogueira  
“Quando uma escola de samba entrava no desfile, você olhava para  
trás e via um fogaréu”, declarou Mestre Marçal sobre os primeiros  
desfiles no Rio de Janeiro. Assim como os tambores da parelha, os  
instrumentos de percussão das baterias cariocas também eram  
originalmente afinados no calor de uma fogueira. Fernanda  
Florentino representa o calor que aquece e afina os tambores da  
Primeira Academia.  
Bateria  
(130 componentes)  
Tambozeiros da  
Rainha  
Representam os tocadores da parelha no Tambor de Crioula,  
chamados de Tambozeiros, que em nosso desfile colocam os  
tambores do Maranhão em comunhão com os tambores do Morro do  
Engenho.  
Ala 8  
(32 componentes)  
Lua Cheia  
A lua assume papel relevante nas diversas lendas e na cultura de São  
Luís, como prova o cancioneiro popular:  
Ó Lua linda prateada  
Que vem surgindo mais feliz  
Eu quero ver a estrela Dalva  
Outra vez em São Luís”  
Ala 9  
(30 componentes)  
Touro Negro  
Segundo a lenda, nas noites de sexta-feira, Dom Sebastião aparece  
na praia na forma de um touro negro, com uma estrela na testa. Se  
alguém conseguir atingir a estrela e ferir o touro, São Luís  
submergirá; do mar surgirá a cidade encantada com os tesouros do  
Rei.  
Carro 2  
Africanidades na  
As diversas lendas e mistérios que compõe a cultura popular em São  
Terra da Encantaria Luís se fundiram à cultura Jeje Mina e influenciaram na formação  
do Tambor de Mina e do Tambor de Crioula.  
Destaque  
Murilo Argollo  
Serpente de Prata  
Dan, a serpente que mordeu a própria cauda e deu origem ao mundo,  
renasce em São Luís. Mas ao contrário de Dan, a serpente prateada  
vive nas galerias subterrâneas da cidade e cresce sem parar,  
rodeando a ilha até que sua cabeça encontre o rabo. Quando a  
Serpente de Prata morder a própria cauda, haverá um grande  
terremoto que destruirá a civilização ludovicense.  
TERCEIRO SETOR: DOS FOLGUEDOS POPULARES À VOZ DOS TAMBORES DE CARNAVAL  
Ala 10  
(25 componentes)  
Bumba-meu-boi  
Folguedo de São Luís, tradicionalmente encerrado com uma roda de  
Tambor de Crioula. Originalmente, as brincadeiras de Bumba-meu-  
boi e o Tambor de Crioula aconteciam sempre juntas, eram práticas  
interligadas. Ainda hoje não há matança de boi, sem uma roda de  
Tambor de Crioula em seu encerramento. A voz dos tambores se  
intensifica no mês de agosto, época da prática do Bumba-meu-boi.  
O Santo Preto, padroeiro do Tambor de Crioula.  
Muso Hamylton Policarpo  
Musa Dandara Rodrigues  
São Benedito  
Devoção a São  
Benedito  
Graças ao sincretismo com Toi Averekete, São Benedito é um dos  
santos católicos mais populares em São Luís, reverenciado tanto no  
Tambor de Mina quanto no Tambor de Crioula.  
Ala 11  
(24 componentes)  
Pagadores de  
Promessa  
A devoção a São Benedito é evidente nos chamados Tambores de  
Promessa, quando se promete realizar uma roda de Tambor de  
Crioula em homenagem ao Santo caso se alcance determinada graça.  
Outro período em que se observa uma maior concentração de rodas  
de Tambor de Crioula são as festas de São João, bastante tradicionais  
no Maranhão.  
A herança francesa em terras ludovicenses fica evidenciada em  
expressões utilizadas nas festas juninas, como “en arrière” (para trás,  
em francês). O comando anarriê indica o momento em que se deve  
voltar para o seu lugar de origem na dança da quadrilha.  
Ala 12  
(32 componentes)  
Festejos Juninos  
Anarriê!  
Musa  
Jéssica Guirgo  
Ala 13  
(30 componentes)  
Tambores ancestrais Representa os tambores africanos que se encontram na  
ancestralidade de todas formas de percussão da chamada Família do  
Samba no Brasil: “a negritude em resistência, com essência  
ancestral”!  
Ala 14  
Vidas negras  
importam  
Da roda da saia à roda de samba, a Primeira Academia dá voz ao  
teu Tambor.”  
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(40 componentes)  
Neste momento, o desfile suspende a ficção carnavalesca para  
cumprir aquilo que foi prometido na sinopse. A narrativa é  
interrompida sem perder a adequação ao enredo, pois esta ala mostra  
a realidade das pessoas pretas e denuncia a marginalização e a  
discriminação dos descendentes de escravizados que persistem até a  
atualidade. Compõe a ala moradores de diversas comunidades do  
Rio de Janeiro que perderam familiares e entes queridos para a  
violência que assola exclusivamente as pessoas pretas. A história do  
Tambor de Crioula é uma história de resistência, sua voz clama:  
“Chega de opressão”!  
Ala 15  
(40 componentes)  
Coreiras  
Apenas as mulheres dançam e entram em transe na roda de Tambor  
de Crioula. A força das mulheres pretas está representada na saia  
rodada, de renda, cetim ou chitão, que simbolicamente se transforma  
no manto de São Benedito: “Coreira na barra da saia tem poder”!  
Junto com o período junino e a temporada de Bumba-meu-boi, o  
Carnaval é um dos principais momentos do ano em que se intensifica  
a prática de rodas de Tambor de Crioula. O segundo casal de Mestre-  
Sala e Porta-bandeira interpreta a dupla romântica mais popular do  
carnaval: personagens importados da commedia dell’arte italiana,  
aqui representados com elementos que remetem à cultura popular  
maranhense.  
Segundo casal de Mestre-  
sala e Porta-bandeira  
Pierrot e Colobina  
Grupo de destaques de chão  
(6 componentes)  
Carnaval em São  
Luís  
Representam o Carnaval nas ruas do centro de São Luís. Seja lá ou  
aqui no Rio de Janeiro, os tambores falam mais alto no Carnaval! O  
grupo veste fantasias tradicionais no carnaval brasileiro.  
Ala 16 - Velha-guarda  
(10 componentes)  
Ancestralidade da  
Primeira Academia deram voz aos tambores da Primeira Academia.  
Representa os primeiros moradores do Morro do Engenho, que  
Ala 17 Compositores  
(20 componentes)  
Compositores  
Ala de Compositores da Acadêmicos do Engenho da Rainha.  
Fonte: O autor.  
DE SÃO LUÍS AO RIO DE JANEIRO TAMBORES EM COMUNHÃO  
Os tambores do Engenho  
Saúdam os do Maranhão  
Ressoa uma “toada-enredo”  
A parelha em vibração  
com matraca, pandeiro  
E tamborim na marcação. (Jesus; Ramos, 2020)  
Com base no trabalho de campo realizado em São Luís e contando com envio de  
material bibliográfico pelo Prof. Neto de Azile, diretor da Casa do Tambor, lancei-me à tarefa  
de elaborar a sinopse do enredo. Busquei abordar o tambor de crioula em toda sua  
ancestralidade africana e reforçar a familiaridade com o samba carioca:  
(...) o Tambor de Crioula apresenta certas características que o associam ao  
gênero samba, aproximando-se, por exemplo, do Samba de Roda do  
Recôncavo Baiano, do Jongo, praticado na região Sudeste, e mesmo de  
modalidades do Samba Carioca: o partido alto, o samba de breque e o samba-  
canção aspecto, de resto, já identificado pela bibliografia sobre o assunto ao  
cunhar o termo “família do samba”. Nesse sentido, pode-se constatar os  
seguintes traços convergentes e comuns: a polirritmia dos tambores, a síncopa  
(frase rítmica característica do samba), principais movimentos coreográficos  
e a umbigada (Ramassote, 2006, p. 22).  
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Outra característica que as Escolas de Samba em seus primeiros anos de desfile tinham  
em comum com os grupos de tambor de crioula era a prática de afinar os instrumentos no calor  
de uma fogueira: “cada um saía com seu jornal no bolso. Está muito grave? Parou na calçada,  
acendeu o jornal, esquentou, bateu com a mão. (...) Quando uma escola de samba entrava no  
desfile, você olhava para trás e via um fogaréu” (Marçal, apud Cabral, 2011, p. 109, 110).  
Ademais, os grupos de tambor de crioula atualmente costumam ser dirigidos por líderes de  
grupos de bumba-meu-boi ou de alguma Escola de Samba de São Luís (Ferretti, 2006, p. 104),  
o que comprova a proximidade ou poderia dizer intimidade cultural de tais manifestações.  
As similitudes entre o samba e o tambor de crioula mereceriam uma resenha própria; aqui não  
me aprofundarei neste tema, apenas pontuo as características em comum que guiaram o meu  
olhar artístico no desenvolvimento do desfile. Questões que foram assim sintetizadas na  
sinopse:  
Da roda da saia  
À roda de samba  
tudo gira, tudo roda:  
- toada, toque, tambor,  
improviso, umbigada,  
requebros e rodopios -.  
Tudo é dança e circular. (Jesus; Ramos, 2020)  
PUNGA, CRIOULA! DO DIZÍVEL AO VISÍVEL  
O projeto foi iniciado nos primeiros momentos da pandemia de COVID-19, com a  
redação da sinopse do enredo, em coautoria com a pesquisadora e poetisa Lúcia Helena Ramos.  
Trabalho realizado de forma remota, através de conversas em aplicativos de mensagens e  
reuniões virtuais. A sinopse de Punga, Crioula! era composta por três partes. Iniciava com uma  
Apresentação escrita de forma livre, informal e despretensiosa para despertar a benevolência e  
o interesse do leitor sobre o tema; seguida pela Justificativa fundamentada nos dados coletados  
nas pesquisas para contextualizar o leitor no universo cultural ludovicense e esclarecer a  
relevância de abordar o tambor de crioula no carnaval carioca na atualidade; finalizava com um  
poema, sendo esta parte a Sinopse propriamente dita, o dizível destinado a produzir as imagens  
literárias que deveriam guiar os compositores na criação do samba-enredo e que conduziriam o  
desenvolvimento visual do desfile.  
Passando à etapa de desenhos, optei por desenhar primeiramente as alegorias. Por ser o  
único responsável pelo projeto cenográfico, pude produzir individualmente os croquis dos  
carros alegóricos, respeitando as determinações de quarentena e distanciamento social. Tão  
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logo foram flexibilizadas as determinações de isolamento, com a possibilidade de reunião de  
grupos pequenos de pessoas, foram iniciados os desenhos de fantasias com parte da equipe de  
figurinistas atuando de forma remota e outra parte presencialmente. A princípio, acreditava-se  
que o desfile seria possível já no carnaval de 2021. Entretanto, o desfile foi adiado para 01 de  
maio de 2022, quando finalmente houve condições sanitárias para tanto.  
Dentre as fantasias apresentadas, destaco inicialmente o figurino da terceira ala, em  
referência a Toi Averekete, Vodun da Nação Jeje Mina relacionado ao mar e à pesca, cujas  
cerimônias religiosas praticadas pelos escravizados no Maranhão contribuíram para o  
surgimento do tambor de crioula. Após pesquisas relacionadas às características da divindade,  
juntamente com Felipe Cunha, estudioso das religiões de matriz africana, foram realizados  
estudos imagéticos (figura 1) para a elaboração do croqui do figurino (figura 2).  
Figura 1 Estudo para a Ala Toi Averekete.  
Fonte: Felipe Cunha, 2020. Acervo do autor.  
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Figura 2 Croqui da Ala Toi Averekete.  
Fonte: Leo Jesus e Carolina Bianque, 2020. Acervo do autor.  
Figura 3 Ala Toi Averekete. Engenho da Rainha, 2022.  
Fonte: Fabrício Goyannes. Imagem cedida gentilmente para o acervo do autor.  
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O croqui da ala Encantados do mar (figura 4) propunha uma silhueta renascentista, em  
referência aos navegadores europeus e a Dom Sebastião, rei português que desapareceu durante  
as Cruzadas, se incorporou ao imaginário popular lusobrasileiro e se integrou ao universo  
mitológico ludovicense. O costeiro4 tinha a forma de uma vela rota de embarcação naufragada.  
Para sua confecção, foi utilizada uma estrutura em vime. A proposta inicial era forrá-la com  
algodãozinho cru, que receberia posteriormente um tratamento de envelhecimento. Entretanto,  
por questões orçamentárias, foram realizados testes na busca de uma solução mais barata e que  
permitisse o mesmo efeito visual.  
Figura 4 Croqui da ala Encantados do mar.  
Fonte: Leo Jesus e Carolina Bianque, 2020. Acervo do autor.  
Após comprovada a viabilidade do beneficiamento têxtil pretendido, os costeiros foram  
forrados com entretela, material recebido em grande quantidade como doação de uma fábrica  
de tecidos. Para o envelhecimento da entretela, foi borrifada uma solução de aquarela silk na  
cor siena (figura 5). Em seguida, para criar uma sensação de profundidade e acentuar a  
4 Costeiros são estruturas que compõem a parte traseira de uma fantasia de Escola de Samba, normalmente confeccionadas em ferragem ou  
vime, forradas com tecido e decoradas conforme o croqui. A nomenclatura provavelmente se deve ao fato de que tais estruturas são encaixadas  
nos ombros do componente e formam uma espécie de fundo para a fantasia posicionado nas costas do desfilante.  
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impressão de apodrecimento, foi aplicado betume da judéia com uma esponja. A pintura de arte  
foi feita com colorjet, utilizando-se dois tons de verde para sugerir a presença de musgos. Ao  
final, a estrutura foi decorada com tiras de organza verde, que simulavam algas marinhas.  
Figura 5 Processo de pintura de arte do costeiro da ala Encantados do Mar.  
Fonte: Acervo do autor.  
Como se tratava de material extremamente frágil, as velas de entretela não foram  
rasgadas conforme previsto no croqui. As estruturas tinham cerca de 1,5m de altura e seriam  
transportadas em caminhão pela agremiação até o local da concentração, onde seriam entregues  
aos componentes. Havia o risco de danificá-las nessa operação: caso os rasgos fossem feitos  
antes do transporte, poderiam chegar ao desfile ainda maiores e desiguais, o que passaria a  
impressão de que foram acidentais, em vez de planejados. Desta forma, somente na  
concentração iniciamos o processo de corte da entretela para dar a impressão de velas rotas da  
embarcação. O resultado final (figura 6) ficou bastante satisfatório e foi elogiado pela imprensa  
e nos canais de transmissão do desfile na plataforma YouTube.  
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Figura 6 Ala Encantados do mar. Engenho da Rainha, 2022.  
(Fonte: Fabrício Goyannes. Imagem cedida gentilmente para o acervo do autor).  
O processo de criação e produção do desfile testemunhou relevantes questionamentos e  
protestos antirracismo no Brasil e no mundo, que se acentuaram conforme a pandemia  
escancarava as desigualdades raciais. A sinopse de um enredo sobre o tambor de crioula não  
poderia desconsiderar a sua potência enquanto manifestação de resistência dos escravizados no  
Maranhão:  
O Tambor de Crioula tem voz! A negra voz, que para não se calar, reverberou no  
couro e nos corpos, rememorando a essência da liberdade perdida.  
O Tambor de Crioula tem mistérios invisíveis! O transe libertava as almas de corpos  
aprisionados, garantindo aos escravizados a resistência espiritual necessária para  
suportar os sofrimentos. (Jesus; Ramos, 2022)  
Optei por não representar visualmente escravizados, conforme poderia se imaginar a  
partir do trecho da sinopse acima transcrito, mas romper a ficção carnavalesca para apresentar  
a realidade dos seus descendentes na sociedade brasileira. Assim, foram convidados para  
desfilar na ala 14, pessoas pretas que perderam parentes assassinados por balas perdidas em  
confrontos entre a Polícia Militar do Rio de Janeiro e criminosos. Alguns eram moradores da  
própria Comunidade do Morro do Engenho, de onde se originou a Acadêmicos do Engenho da  
Rainha. Não usariam fantasia; vestiriam apenas uma calça e uma camiseta brancas com dizeres  
de ordem. Os únicos adereços carnavalizados seriam um boné em EVA vermelho e branco,  
para dar unidade visual ao grupo, além de uma placa de EVA moldada como uma espécie de  
muro de tijolos, em que foram pintadas frases de protesto (figura 7).  
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Figura 7 Ala Vidas negras importam. Engenho da Rainha, 2022.  
Fonte: Fabrício Goyannes. Imagem cedida gentilmente para o acervo do autor.  
O desfile encerrava com uma celebração às práticas carnavalescas ludovicenses, dentre  
as quais se destacam as rodas de tambor de crioula. Seis destaques de chão fantasiavam-se como  
personagens tradicionais do carnaval: pierrôs, arlequins e colombinas em fantasias que  
mesclavam o vermelho cor da agremiação ao azul em referência aos casarões azulejados  
do Centro Histórico de São Luís. À frente do grupo, desfilavam o segundo casal de mestre-sala  
e porta-bandeira, cujos figurinos seguiam a mesma temática. Para transformá-los em  
Colombina e Pierrot sem perder as referências ao tambor de crioula, o figurinista Uilber  
Guarinho5 confeccionou em chita a saia da porta-bandeira e a calça do mestre-sala (figura 8),  
conforme as orientações do carnavalesco.  
5 Egresso do curso de Pós-graduação em Figurino e Carnaval da UVA; fará sua estreia como carnavalesco do GRES. Leão da Nova Iguaçu nos  
desfiles da Série Prata em 2025.  
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Figura 8 Segundo casal de mestre-sala e porta-bandeira. Engenho da Rainha, 2022.  
Fonte: Fabrício Goyannes. Imagem cedida gentilmente para o acervo do autor.  
CONSIDERAÇÕES FINAIS  
O resultado conjunto das pesquisas artísticas e acadêmicas foi apresentado no desfile  
realizado no dia 01 de maio de 2022, pelo Grupo B da Liga LIVRES/RJ, na passarela da Estrada  
Intendente Magalhães.  
Desde sua proposta, o enredo teve excelente recepção entre os diretores do GRES.  
Acadêmicos do Engenho da Rainha e os moradores da Comunidade do Morro do Engenho. Foi  
também muito bem recebido pela diretoria da Casa do Tambor, que acompanhou a redação da  
sinopse e o processo de escolha do samba-enredo. Em live transmitida nas redes sociais daquela  
instituição, a sinopse foi elogiada pelo Prof. Neto de Azile, que afirmou se sentir representado  
pelo texto, por parecer ter sido escrito por um maranhense.  
O mesmo pôde ser observado em relação ao projeto de criação e produção das fantasias.  
Todos julgadores dos quesitos Enredo e Fantasias atribuíram notas 10 (dez) ao tema e ao  
conjunto de figurinos, respectivamente, o que contribuiu para a conquista do título da  
competição pela Acadêmicos do Engenho da Rainha. Contribuíram, também, para a conquista  
dos prêmios de Melhor Enredo e Melhor Conjunto de Fantasias e Adereços do Jornal Ritmo  
Carioca, além do prêmio de Melhor Carnavalesco do Jornal Gazeta do Rio.  
Os praticantes de tambor de crioula também parecem ter validado o desfile, conforme  
registrado em redes sociais, merecendo destaque a postagem no Twitter do então Secretário da  
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Cultura do Estado do Maranhão, Paulo Victor (PCdoB), repostada no perfil da Casa do Tambor  
no Instagram (figura 9).  
Figura 9 Tuíte de Paulo Victor, Secretário da Cultura do Maranhão, 2022.  
Fonte: Perfil da Casa do Tambor no Instagram (@casadotambor_). Captura de tela.  
Os resultados alcançados, assim, demonstram que o desfile foi bem recebido por  
espectadores com diferentes perspectivas, comprovando a eficácia da metodologia utilizada na  
criação dos figurinos. Através do fazer artístico do carnaval, portanto, pude aplicar as minhas  
investigações teóricas e acadêmicas a serviço da narrativa carnavalesca e assim permitir aos  
espectadores e aos julgadores a leitura adequada das mensagens codificadas nas imagens  
apresentadas em uma mise-en-scène significante.  
REFERÊNCIAS  
ABRANTES, Samuel. Itinerários da Criação: Abismo, dobra e figurino. Rio de Janeiro:  
Boaz, 2017.  
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FILIPECKI, Elizabeth. A utilização de pranchas iconográficas na criação de figurinos de  
época para a teledramaturgia. dObra[s] Revista da Associação Brasileira de Estudos de  
Pesquisas em Moda, [S. l.], v. 10, n. 22, p. 143160, 2017. Disponível em:  
PAVIS, Patrice. Dicionário de Teatro. 3.ed. São Paulo: Perspectiva, 2008.  
FERRETTI, Sergio. Mário de Andrade e o Tambor de Crioula do Maranhão. Revista Pós  
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RAMASSOTE, R (coord.). Os Tambores da Ilha. São Luís: IPHAN, 2006.  
RANCIÈRE, Jacques. O destino das imagens. Rio de Janeiro: Contraponto, 2012.  
UBERSFELD, Anne. Para ler o teatro. São Paulo: Perspectiva, 2013.  
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