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AUDIOVISUAL NO ENSINO DE ARTE: BREVES
CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS
Meri Silva de Moraes
1
Vera Lúcia Penzo Fernandes
2
RESUMO
Na sociedade contemporânea, as crianças estão em contato com diversas formas de
audiovisual, mesmo antes de entrarem no período escolar. As diversas telas que nos
atravessam cotidianamente fazem do audiovisual parte da nossa vida, especialmente após
2020, com o início da pandemia do COVID-19, que instaurou o uso do audiovisual no meio
educacional, seja por meio das lives, do ensino remoto das universidades ou mesmo das vídeo
aulas gravadas para o ensino básico. O percurso do audiovisual, no entanto, data de antes da
chegada da internet, iniciando-se com a vinda do cinema para o Brasil, no ano de 1896. o
ensino de arte tem início com a Academia Imperial de Belas Artes, no ano de 1826, mas com
registros da sua existência desde a chegada dos jesuítas, ao que viria a ser o Brasil. As
tendências pedagógicas vão surgindo ao longo da história e interferem nas práticas do ensino
de arte e até mesmo na configuração da escola como a entendemos hoje. É em meio a essas
configurações históricas que as diversas formas do audiovisual (como o cinema, cinema
educativo, documentário, vlog, vídeo arte, vídeo) vão adentrando o ambiente escolar e,
consequentemente, o ensino de arte. Propomo-nos fazer uma breve apresentação sobre esses
processos, buscando investigar as relações da inserção do audiovisual nas aulas com o ensino
de arte. Para isso, realizaremos um levantamento bibliográfico, com base na pedagogia
histórico-crítica de Saviani (2011), de suas investigações sobre as pedagogias na educação
brasileira, dos estudos sobre a criatividade no ensino de arte de Fernandes (2016) e dos estudos
de Vilaça (2013), que trazem especificamente a trajetória histórica do audiovisual. Este artigo
apresenta parte dos estudos para o trabalho de conclusão de curso com o título Ensino de arte
e o audiovisual: por uma práxis criativa, no qual se objetiva pesquisar o ensino de arte e a
possibilidade do uso audiovisual para a construção de uma práxis criadora no trabalho
pedagógico do professor de arte.
Palavras-chaves: Ensino de arte. Audiovisual. Cinema. Pedagogia Histórico-crítica
1
Licenciada em Artes Visuais com habilitação em Artes Plásticas pela Universidade Federal do Mato Grosso do
Sul, especializada em Gestão Cultural Contemporânea pela Escola Itaú Cultural e graduanda em Relações
Internacionais pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, UNESP.
2
Doutora em Educação pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Professora do curso de artes visuais -
licenciatura e do mestrado profissional em Arte (ProfArtes); coordenadora do grupo de Pesquisa Ensino e
Aprendizagem em Artes Visuais (UFMS/CNPq).
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AUDIOVISUAL IN ART TEACHING: BRIEF HISTORICAL
CONSIDERATIONS
Meri Silva de Moraes
*
Vera Lúcia Penzo Fernandes
ABSTRACT
In contemporary society, children are in contact with various forms of audiovisual media, even
before they enter school. The various screens that cross our daily lives make audiovisual part
of our lives, especially after 2020, with the start of the COVID-19 pandemic, which introduced
the use of audiovisual in the educational environment, whether through live streams or remote
teaching at universities. or even recorded video classes for basic education. The audiovisual
journey, however, dates back to before the arrival of the internet, starting with the arrival of
cinema in Brazil, in 1896. Art teaching began with the Imperial Academy of Fine Arts, in the
year from 1826, but with records of its existence since the arrival of the Jesuits, in what would
become Brazil. Pedagogical trends emerge throughout history and interfere in art teaching
practices and even in the configuration of schools as we understand them today. It is in the
midst of these historical configurations that the various forms of audiovisual (such as cinema,
educational cinema, documentary, vlog, video art, video) enter the school environment and,
consequently, art teaching. We propose to make a brief presentation about these processes,
seeking to investigate the relationships between the insertion of audiovisual in classes and art
teaching. To do this, we will carry out a bibliographical survey, based on the historical-critical
pedagogy of Saviani (2011), his investigations into pedagogies in Brazilian education, studies
on creativity in art teaching by Fernandes (2016) and studies by Vilaça (2013), which
specifically outline the historical trajectory of audiovisual. This article presents part of the
studies for the course conclusion work with the title Art teaching and audiovisual: for a creative
praxis, which aims to research art teaching and the possibility of using audiovisual for the
construction of a creative praxis in the pedagogical work of the art teacher.
Keywords: Art teaching. Audio-visual. Movie theater. Historical-critical pedagogy
*
Graduated in Visual Arts with specialization in Fine Arts from the Federal University of Mato Grosso do Sul,
specialized in Contemporary Cultural Management from Escola Itaú Cultural and graduating in International
Relations from Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, UNESP.
PhD in Education from the Federal University of Mato Grosso do Sul. Professor of the visual arts course - degree
and professional master's degree in Art (ProfArtes); coordinator of the Teaching and Learning in Visual Arts
Research group (UFMS/CNPq).
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INTRODUÇÃO
O audiovisual faz parte da cultura da sociedade contemporânea e, seja, por meio dos
aparelhos televisores ou dos aparelhos celulares, diversos vídeos são constantemente
apresentados a uma parcela considerável da população. As crianças m contato com esse
universo de produções, mesmo antes de chegarem à escola, porém em uma perspectiva de
observadores passivos, não estabelecendo leituras profundas e/ou críticas com aquilo que
assistem.
De acordo com um levantamento feito nos anais do CONFAEB, Congresso Nacional da
Federação de Arte/Educadores do Brasil, entre os anos 2016 e 2019, foram encontradas 11
pesquisas: Abreu e Castro, 2018; Costa e Brasil 2019; Oliveira Junior, 2019; Fonseca, 2016;
Machado, 2019; Neto, 2017; Pinheiro, Lopes e Carvalho, 2018; Rabelo, 2018; Ronco, 2018;
Silva, Silva e Farias, 2017; Silva e Oliveira, 2018. Tais estudos apresentam o uso de distintas
formas de audiovisual em distintos níveis, desde o ensino básico até a formação de professores.
Do cinema à videoarte, incluindo também produções voltadas para o youtube com o formato de
vlog, os professores mostram a variedade de usos do audiovisual em sala de aula e reconhecem
o potencial deste para o processo de ensino aprendizagem.
Segundo Machado (2019), o uso do termo audiovisual vem no sentido de abranger
outras produções, não apenas a cinematográfica que, ainda de acordo com a autora, seria uma
experiência mais restrita ao se pensar no espaço físico da caixa-preta do cinema. No entanto,
esse entendimento é bem recente e o uso do audiovisual no ambiente escolar é anterior.
Neste artigo, propomo-nos a fazer a apresentação de alguns acontecimentos históricos
que influenciaram na maneira como o audiovisual foi inserido na escola e mais especificamente
no ensino de arte. Este estudo faz parte do trabalho de conclusão de curso intitulado O ensino
de arte e o audiovisual: por uma práxis criativa, que investiga práticas de professores de arte
que usam o audiovisual em sala de aula, vinculado ao Grupo de Pesquisa Ensino e
Aprendizagem em Artes Visuais (GPENAV).
Temos como base a pedagogia histórico-crítica de Saviani (2011), os estudos de
Fernandes (2016) sobre criatividade, e a tese de doutorado de Vilaça (2013), Inclusão
audiovisual na educação: A Experiência do Projeto Horizontes Periféricos, para, através desses,
fazer breves menções sobre as mudanças nas pedagogias no Brasil, com as práticas dos
professores de arte e a inserção do audiovisual na escola.
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O ENSINO DE ARTE E O AUDIOVISUAL
Antes da chegada do cinema ao Brasil, a pedagogia e o ensino de arte haviam
construído caminhos. Segundo Saviani (2011, p.76), os jesuítas são responsáveis pela educação
como aquela que hoje entendemos como a do Brasil de até meados do século XVIII. Eles
seguiam uma pedagogia católica, tendo alinhados os princípios de uma pedagogia tradicional
escolástica aos ensinamentos morais e religiosos. o ensino de arte vai ter início, de forma
institucionalizada, com a Academia Imperial de Belas Artes (AIBA), no ano de 1826, dentro
de uma pedagogia consolidada como tradicional e acadêmica.
Os responsáveis por estabelecerem o ensino dentro da AIBA são os artistas que chegaram
com a Missão Artística Francesa, trazendo consigo a tradição da escola francesa neoclássica.
As práticas pedagógicas propostas nesse período baseavam-se principalmente no ensino de
desenho, a partir de premissas como “cópia de modelos, na imitação de atitudes, no
desenvolvimento de habilidades manuais e de hábitos de precisão, na organização e na limpeza”
(FERNANDES, 2016, p.80).
A pedagogia tradicional, com diferentes vertentes, continua fazendo parte da lógica
educacional, mesmo após Pombal expulsar os jesuítas, fundamentando-se no liberalismo
político e desvinculando-se, em certa medida, da igreja católica, ainda que a influência dessa no
ensino continue presente. Os ideais iluministas são a referência que Pombal tenta instalar no
sistema de ensino e que seguem até o início do século XX(SAVIANI, 2011, p.76), quando
surge a pedagogia escola novista.
no ano de 1896, acontece, no Rio de Janeiro, a primeira exibição cinematográfica,
marcando a chegada do cinema no Brasil, que é introduzido no país a passos lentos e alcança
setores exclusivos da sociedade brasileira. Aqui se valorizam, especialmente, as produções de
caráter educativo que, de certa maneira, advinham das propostas dos irmãos Lumiére, que
advogavam por um olhar voltado “para o registro social e antropológico” (VILAÇA, 2013, p.
58).
Já no ano de 1910, tem-se registro de uma feira de cinema educativo que aconteceu em
São Paulo e realizou a exibição de diversos materiais audiovisuais, muitos dos quais brasileiros.
O cinema chama atenção de educadores e alguns deles vão propor ações institucionais que abrem
caminho para que seja inserido no ambiente escolar, dentre esses, Fernando de Azevedo e
Roquette-Pinto, segundo Vilaça (2013). Fernando Azevedo é responsável pelo Decreto n. 5.492
de 1928, que regulamenta o cinema no ambiente escolar: “o cinema será utilizado
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exclusivamente como instrumento de educação e como auxiliar do ensino que facilite a ação do
mestre sem substituí-lo” (SERRANO E VENANCIO Fº, 1930, p.12 apud VILAÇA, 2013,
p.146). No mesmo decreto consta a proposição de que as escolas que estivessem em pleno
funcionamento deveriam ser equipadas com salas de vídeo. Já Roquette- Pinto, que foi diretor
do Museu Nacional, estabeleceu que o museu era um espaço que deveria criar imagens para a
ação educativa. Em 1932, cria a Revista Educação do Museu Nacional que inspira, em 1936, a
criação do Instituto Nacional de Cinema Educativo (INCE). No mesmo ano de criação da
revista, ele também participa do grupo que lança o Manifesto da Escola Nova.
A Escola Nova rompe com as práticas copistas, promovendo a livre expressão,
chegando, inclusive, a “ponto de se negarem as influências externas, como forma de preservar
o potencial criativo da criança” (FERNANDES, 2016, p. 80). Significa dizer que essa linha
pedagógica compreendia que a criação era algo inerente à infância e que os educadores não
podiam interferir nesse processo. Segundo Vilaça (2013, p.149), é durante a década de 1930
que surge o pensamento do uso do cinema educativo como estratégia para suplantar uma
educação popular. O INCE se constitui como uma política do governo de Getúlio Vargas, no
ano de 1937, iniciando a criação de materiais audiovisuais, principalmente, para campanhas
sanitárias e educativas, sendo visto de maneira elitista, em que aqueles que produziam o
material eram detentores de um saber que iam ensinar aos “ignorantes”. Na idealização do
INCE, Roquette-Pinto considerava que o material ali criado deveria atender a uma grande parte
da população, porém as políticas e as logísticas de distribuição da época não permitiram uma
abrangência nacional.
Entre as décadas de 1930 e 1940, surgem iniciativas cinematográficas, tanto públicas
quanto privadas, principalmente em Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro. Humberto
Mauro é um dos artistas que se consagra nesse momento, sendo referenciado por Glauber Rocha
como criador do Cinema Novo, tendo produzido principalmente através do INCE, instituição
da qual também foi diretor. Segundo Vilaça (2013, p.151), durante os anos 1935 a 1937, houve
um aumento no número de projetores nas escolas de Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo e
Distrito Federal, evidenciando que era uma preocupação das escolas. Nos dados estatísticos o
então estado do Mato Grosso antes da separação não aparece.
A televisão segue um caminho distinto em relação ao cinema, tendo chegado ao Brasil
durante a década de 1950, por meio da ação de Assis Chateaubriand (1892-1968), e tendo em
quase vinte anos alcançado números expressivos de espectadores, os quais não podem ser
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comparados de maneira direta com os números do cinema, visto que, se em 1980 podemos
contabilizar 2365 salas de cinema, em contrapartida, são pelo menos 3.276.000 aparelhos
televisores, contabilizados 19 anos depois da primeira transmissão televisiva (VILAÇA, 2013,
p.114). A estética da televisão no Brasil, nesse primeiro momento, advém dos programas de
rádio, especialmente das radionovelas. Na década de 1970, com a chegada da fita de vídeo, que
permitia que os programas fossem gravados, a televisão vai estabelecer intercâmbios com a
estética cinematográfica. A partir dos anos 1980, a televisão adquire propósitos comerciais e é
“obrigada a buscar uma padronização. Uma série de arquétipos estéticos e narrativos foi criada
para facilitar e acelerar a produção. E esses modelos são repetidos continuamente na
programação.” (VILAÇA, 2013, p.115)
Durante essas décadas de popularização dos aparelhos televisores, entre 1960 e 1970,
acontece o golpe civil militar são estabelecidos os acordos MEC USAID, que promovem a
pedagogia tecnicista no ambiente escolar, fazendo com que a pedagogia escola novista perca
força. Essa pedagogia é “centrada nas ideias de racionalidade, eficiência e produtividade”
(SAVIANI, 2011, p.77) e faz uma profunda modificação em como os professores são
percebidos, estabelecendo-se uma imagem de que os educadores seriam técnicos que passariam
determinadas habilidades para os alunos. No ensino de arte a influência da livre-expressão ainda
era presente, porém assume aqui um caráter de produção de atividade mecânica. Segundo
Fernandes (2016, p.82), “a pedagogia tecnicista […] advogava uma concepção mais
mecanicista; os professores desenvolviam seus planejamentos centrados em objetivos que
deveriam ser operacionalizados de forma minuciosa, inclusive por meio do uso abundante de
recursos tecnológicos e audiovisuais”.
Em 1971, acontece a aprovação da lei 5692/71, instituindo a obrigatoriedade da
disciplina Educação Artística que “substitui as disciplinas Desenho, Música, Canto Orfeônico
e Trabalhos Manuais” (FERNANDES, 2016, p. 83). Essa mudança impacta diretamente a
realidade dos educadores, pois a formação dos licenciados em Educação Artística começa a ser
polivalente, para darem conta das diferentes linguagens, como artes visuais, dança, teatro e
música, não contemplando o cinema e ainda menos o audiovisual. De acordo com Vilaça (2013,
p.165), nessa época o audiovisual na escola ou “era produzido especificamente para fins
educativos” ou “era selecionado na indústria cultural para servir de aporte ilustrativo”, sem se
trabalharem questões específicas do audiovisual, como “estrutura narrativa, semiótica ou
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estética''. Isso se deve a questões materiais de falta de equipamentos que levavam a pouca
utilização do vídeo e por questões de percepção sobre a arte.
Nesse momento, percebe-se a necessidade da criatividade no ensino e é por meio da
disciplina Educação Artística que os alunos poderão trabalhar esse aspecto, porém o que está
em voga é a pedagogia tecnicista que, aliada à livre expressão, herança da Escola Nova, faz com
que as atividades de arte sejam tratadas como atividades mecanicistas e vazias de significado
estético. Segundo Fernandes (2016) e Vilaça (2013), é aqui que começam os embates sobre o
trabalho do professor de Arte: aqueles que exerciam a docência vinham de uma prática de
ateliê e aqueles que vinham das licenciaturas curtas ou plenas em Educação Artística traziam
uma corrente polivalente do ensino. Fernandes (2016, p. 87) defende que nesse período “os
poucos professores de arte que conseguiam desenvolver um trabalho pedagógico consistente
conseguiram mostrar que ensinar e aprender arte envolve conhecimentos específicos sobre
técnicas, procedimentos e processos de expressão e criação inerentes a cada linguagem
artística”. Isso evidencia a necessidade de uma formação mais abrangente e mais profunda nos
cursos de licenciatura.
Durante a década de 1980, o audiovisual começa a ser inserido no ensino de arte pelo
“viés da cognição imaginativa”, despertando também para as discussões que envolviam o
desenvolvimento da criatividade. Outro marco histórico relativo ao audiovisual na época é o
intento da alfabetização das massas, por meio do programa Educação para Todos (1985), em
que Sarney apregoava que a maneira para se alcançar tal objetivo era o currículo das escolas e
elegia o audiovisual como “um dos processos fundamentais para atingir esse objetivo”
(VILAÇA, 2013, p. 168). É nesse contexto que as TVs educativas e programas como o primeiro
Telecurso começam a surgir.
Nos anos 1990, temos um novo avanço do ensino de Arte com a Lei de Diretrizes e
Bases Nacional, nº 9394, de 20 de dezembro de 1996, que continua a manter a obrigatoriedade
do ensino de arte e que abrirá caminhos para que, somente em 2007, a disciplina Educação
Artística passe a ser chamada de Arte. De acordo com Fernandes (2016) e Vilaça (2013), essa
modificação não é apenas uma mudança de nomenclatura, mas mexe na estrutura como a
disciplina é percebida até no âmbito acadêmico, ganhando caráter de área do conhecimento.
Também é com a LDB que se instauram os Parâmetros Curriculares Nacionais que auxiliam os
professores nos percalços de se colocarem contra o ensino polivalente.
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Segundo Vilaça (2013 p.171-172), é com os Parâmetros Curriculares Nacionais que o
audiovisual passa a ser entendido como linguagem relacionando-o às outras artes. Mais
recentemente, temos a lei 13.006/14, que tornou componente curricular obrigatório a exibição
de duas horas de obras cinematográficas nacionais, por mês, sendo integrada na proposta
pedagógica da escola. Não se delimita em qual disciplina a exibição deve acontecer e, ainda
que esteja em vigor, contudo isso fica à mercê da interpretação dos entes institucionais, no
sentido de que, caso o professor ou a direção desconheçam o referido instrumento legal, seu
cumprimento fica prejudicado.
Podemos perceber nesse histórico que o caminho do audiovisual no país vem sendo
trilhado há pelo menos 100 anos, mas que a inclusão no ambiente escolar acontece de maneira
lenta. Entre os motivos estão as condições materiais e históricas necessárias, considerando que
os equipamentos, tanto para a exibição quanto para a produção, mostram-se como dificuldades
que os professores devem superar. As poucas políticas públicas de incentivo à produção e ao
acesso a produções audiovisuais fazem com que muitos professores não tenham tido
possibilidade de vivenciá-lo enquanto experiência estética.
Além da questão material, aspectos ideológicos interferem na presença do audiovisual
na escola; segundo Vilaça (2013), todo o percurso do cinema sempre apresentou disputas sobre
sua utilização, como o embate entre produções cinematográficas que pretendiam capturar
imagens mais documentais da realidade e aquelas em que artistas começavam a capturar cenas
de peças de teatro. Aqui no Brasil, muitas vezes os materiais produzidos estavam inseridos em
contexto de censura e controle do que se produzia, como na criação do Instituto Nacional do
Cinema Educativo, ou durante o período da ditadura civil-militar. Ainda hoje o audiovisual é
presença que gera debates no ambiente escolar.
No ensino de arte é recorrente a ideia de que as aulas são desprovidas de conteúdo e que
seriam, então, atividades recreativas. Essa lógica tem base na pedagogia escola novista, mas
ainda hoje é percebida. Segundo Ferrés (1996, p. 32 apud VILAÇA, 2013, p. 177), “a integração
do vídeo no ensino gera um dilema. Ou se aceita essa tecnologia com toda capacidade
inovadora, assumindo, então, a transformação de todo o sistema educativo, ou a subjuga,
tirando dela todas suas vantagens e colocando-a a serviço da velha pedagogia”. Ou seja, não
basta simplesmente utilizar o audiovisual, mas os professores devem ter conhecimentos
específicos sobre essa linguagem, a fim de garantir um uso que se distingue de uma mera
reprodução da realidade.
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De acordo com Vilaça (2013, p. 175):
Se o lugar do ensino do audiovisual for dentro do campo do ensino de
Arte, que esse último passe a adotá-lo desde a educação infantil. De
certa forma, no mundo contemporâneo, mesmo antes de nascerem, as
pessoas já entram em contato com algum dispositivo audiovisual, como
a câmera essencial nos aparelhos de ultrassom. A maioria das crianças
do século XXI têm uma habilidade desde a primeira infância para
manipulação de dispositivos com interface por imagens. Muitos
adolescentes de hoje são uma espécie de seres cibernéticos, que
provavelmente não conseguiriam sobreviver sem seus prolongamentos
tecnológicos de comunicação e produção de imagens. Para um ensino
de Arte atualizado e sintonizado com essa contemporaneidade, precisa-
se trabalhar com o ensino do audiovisual, em todas as etapas do ensino
formal.
Ele defende que o ensino audiovisual deve estar inserido no ensino de arte porque é na
relação com as artes visuais que se pode compreender sua potência, isto é, com as
compreensões estéticas e técnicas das demais linguagens é que se é possível compreender as
distintas extensões do audiovisual, sendo como linguagem ou ferramenta comunicacional
(VILAÇA, 2013, p. 175). Para Barbosa (2008, p.111 apud VILAÇA, 2013, p. 180), é necessário
que os professores “não [aprendam] a ensiná-las, inserindo-as na produção cultural dos
alunos, mas também [ensinem] para a recepção, o entendimento e a construção de valores das
artes tecnologizadas, formando um público consciente”.
A partir disso, podemos perceber que a potencialidade do uso do audiovisual no
ambiente escolar não deve se resumir aos professores de arte; o audiovisual deveria ser
integrado à cultura escolar tal como está na sociedade. Na impossibilidade disso acontecer,
ao menos de imediato, cabe ressaltar que qualquer intento de trazê-lo para dentro da sala de
aula é importante. Porém, a disciplina Arte tem um papel específico nesse processo, pois é
através da educação estética, quando analisamos o desenvolvimento da história da arte e suas
linguagens, que é possível compreender o audiovisual, suas diversas linguagens, formas e
representações: do cinema ao videoarte ou até mesmo os vlogs contemporâneos.
CONCLUSÕES
Este levantamento apresentado trata-se de uma parte inicial dos estudos em andamento
para o trabalho de conclusão de curso de licenciatura em Artes Visuais. Assim, pretendemos
informar e abrir possibilidades de diálogo, a partir das informações aqui presentes. Podemos, a
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partir do que foi apresentado, perceber como as políticas públicas que envolvem a produção,
distribuição e exibição de materiais audiovisuais foram fundamentais para que fosse inserido
no ambiente escolar, além de compreendermos que esse aporte não pode mais estar fora da
escola, principalmente pelo potencial de dialogar e colocar os alunos como produtores de seu
conhecimento.
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**Este trabalho foi originalmente publicado no livro Aqui jaz
o último ato (2021), da Editora Coletivo Cine-Fórum,
disponível em www.coletivocineforum.com/livros