Ricardo Cortez Lopes
https://orcid.org/0000-0003-3231-2351
Doutor e Mestre em Sociologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (CAPES 7). É
especialista no estudo das representações, tendo produzido uma série de artigos, capítulos de livros
e livros sobre o tema. Atualmente, atua na Licenciatura em Robótica EAD na Universidade Federal
do Rio Grande do Sul.
PhD and Master's in Sociology from the Federal University of Rio Grande do Sul (CAPES 7). He is
a specialist in the study of representations, having published a series of articles, book chapters, and
books on the subject. Currently, he teaches in the Distance Learning Robotics Program at the Federal
University of Rio Grande do Sul.
Este artigo passou por avaliação por pares cega e software anti-plágio.
LICENÇA ATRIBUIÇÃO NÃO COMERCIAL 4.0 INTERNACIONAL CREATIVE COMMONS CC BY-NC
RECOCINE | v. 2 - n. 2 | mai-ago | 2024 | ISSN: 2966-0513
58
Revista Coletivo Cine-Fórum RECOCINE | v. 2 - n. 2 | mai-ago | 2024 | ISSN: 2966-0513 | Goiânia, Goiás
QUANDO O PESQUISADOR SAI DA TORRE DE MARFIM E
BUSCA O LIKE: UMA ANÁLISE REPRESONTOLÓGICA DA
TRAJETÓRIA DO PESQUISADOR DO ACADEMIA.EDU E DO
CURRÍCULO LATTES
RESUMO
O presente artigo investiga duas representações possíveis de pesquisador por meio do estudo de duas
redes sociais, tomadas em um sentido mais amplo: o Academia.edu e a Plataforma Lattes, promovendo
uma discussão repraesontológica de ambas, considerando-as como representações relacionais dentro de
um entorno. De um ponto de vista qualitativo, as plataformas foram tomadas enquanto elementos áudio-
visuais que expressam percepções do que o pesquisador deve ser por meio das variáveis que são
selecionadas para a composição do avatar: Nome, Instituição, Comprovação, Criação, Descrição,
Publicações, Co-autoria, Indexação, Acessos, Convergência com outras redes e Notificações. Os
resultados apontaram que o academia.edu reforça o lado autoral do pesquisador, enquanto a plataforma
reforça o pertencimento institucional.
Palavras-chave: Pesquisador. Representações. Academia.edu. Plataforma Lattes.
WHEN THE RESEARCHER LEAVES THE IVORY TOWER AND SEARCHS FOR
THE LIKE: AN ANALYSIS OF THE RESEARCHER AT ACADEMIA.EDU AND
LATTES CURRICULUM
ABSTRACT
This paper investigates two possible representations of researchers through the study of two social
networks, taken in a broader sense: Academia.edu and Plataforma Lattes, promoting a
repraesontological discussion of both, considering them as relational representations within of an
environment. From a qualitative point of view, the platforms were taken as audio-visual elements that
express perceptions of what the researcher should be through the variables that are selected for the
composition of the avatar: Name, Institution, Confirmation, Creation, Description, Publications, Co-
authoring, Indexing, Accesses, Convergence with other networks and Notifications. The results showed
that academia.edu reinforces the researcher's authorial side, while the platform reinforces institutional
belonging.
Keywords: Researcher. Representations. Academia.edu. Platform lattes.
59
Revista Coletivo Cine-Fórum RECOCINE | v. 2 - n. 2 | mai-ago | 2024 | ISSN: 2966-0513 | Goiânia, Goiás
INTRODUÇÃO
A reflexão sobre a figura social do pesquisador é um tema não muito popular no meio
científico, justamente porque os pesquisadores estão bastante focados nos seus objetos de
estudo. Logo, o “privilégio da lupa” recai sobre o conteúdo da ciência, a metodologia e a
relevância. Pretendemos, neste espaço, ajudar com uma reflexão sobre o pesquisador, por meio
das discussões sobre a representação, promovidas pela repraesontologia. Pretendemos realizar
essa reflexão tendo em conta alguns contextos que o circundam e o interpenetram.
A reforma de Bologna trouxe muitas mudanças para a configuração da universidade
moderna, entre elas a avaliação constante de instituições e dos profissionais envolvidos. Isso
ensejou a criação de uma cultura de avaliação das instituições universitárias, baseada em
indicadores, o que incidiu também em uma ressignificação do papel do pesquisador, um dos
participantes desse sistema. Prova dessa repercussão no Brasil é o Currículo Lattes (CL), que
transcreve quantitativamente a produção de um pesquisador e que é considerado um documento
oficial. No Brasil, em específico, como a maioria da atividade da pesquisa ocorre em
universidades públicas (em especial as federais), existe uma cultura de accountability, na
publicidade das informações públicas.
Paralelamente a isso, a cultura digital avançou e oportunizou a criação de verdadeiros
“duplos” digitais, o que alguns autores chamam de hiper real (Baudrillard, 1991), especialmente
nas redes sociais. Nessas redes, o usuário participa na construção de uma identidade digital, que
é uma tradução da sua identidade pessoal, os avatares. Estes últimos são compostos por
variáveis preenchidas pelos usuários e por postagens que eles realizam e que podem ser alvo de
interação. Tal como veremos adiante, existem redes sociais que são especializadas: o Linkedin
é voltado para o mercado de trabalho, o Instagram para imagens e vídeos, o twitter para micro-
textos, etc.
Ora, houve iniciativas de aproximar os dois fenômenos (academia e redes sociais) pelas
redes sociais especializadas, que são as acadêmicas, as quais criam avatares cujas variáveis são
focadas na atividade de pesquisa. Nesse sentido, o avatar dessas redes sociais é um tema de
interesse para a pesquisa acadêmica na medida em que (1) evidencia uma visão social desse
pesquisador por outros públicos, (2) permite pensar parcialmente o impacto das produções
desse avatar-pesquisador e (3) contrastar entendimentos do setor público e privado. Assim, o
problema de pesquisa se configura no seguinte: “quais são as representações sobre pesquisador
apresentadas pelas redes sociais Plataforma Lattes e Academia.edu por meio dos perfis
60
Revista Coletivo Cine-Fórum RECOCINE | v. 2 - n. 2 | mai-ago | 2024 | ISSN: 2966-0513 | Goiânia, Goiás
disponibilizados?”. Apesar de estarmos mencionando variáveis, o estudo será de caráter
qualitativo as tomará como categorias de análise, como veremos adiante.
CONHECENDO OS FENÔMENOS: REDES SOCIAIS, PLATAFORMA LATTES E
ACADEMIA.EDU
Nesta seção vamos abordar os conceitos de redes sociais e avatares - esses dois que
localizam os casos particulares em uma teoria maior - e Plataforma Lattes (que vincula o
Currículo Lattes) e Academia.edu - os dois fenômenos que surgem para a análise. Esse tipo de
abordagem vai nos permitir a articulação teórica necessária e a verificabilidade dos dados.
Antes de definir o que são as redes sociais acadêmicas que investigaremos (o
academia.edu e o currículo lattes), é preciso distinguir a formulação utilizada para definir a rede
que se estabelece por citações entre si (Lopes, 2012). Não é nesse sentido que vamos utilizar,
pois estaremos lidando com uma rede social baseada exclusivamente na internet. Mas podemos
tornar mais clara a definição utilizada decompondo o termo.
Assim, com relação às redes sociais, utilizaremos a seguinte definição: “As redes sociais
na Web emergem das práticas de interação orientadas para a partilha e formação de grupos de
interesse que estão na origem das narrativas digitais da Sociedade do Conhecimento” (Barros,
Neves, Seabra, Moreira, Henriques, 2011, s/p). Assim, redes sociais poderiam ser definidas
como um espaço virtual no qual os integrantes conseguem interagir com seus contatos, seja por
via de mensagens diretas, seja por via da construção de painéis de postagens no interior do perfil
(chamados de feed). Nesse sentido, ele une os indivíduos para que eles se relacionem. Para fins
dessa pesquisa, um dos fenômenos é, indiscutivelmente, uma rede social, enquanto o outro,
intencionalmente, não o é, mas por consequência pode ser encaixado na categoria.
O primeiro caso é do Academia.edu (AE). que se define como uma rede social
acadêmica (no sentido do parágrafo acima) que congrega pesquisadores do mundo inteiro. O
seu slogan é o de democratizar e acelerar a produção científica por disponibilizá-los online - no
Brasil, o fato da atividade de pesquisa ser mais exercida no setor público acaba tornando os
arquivos usualmente de acesso gratuito, mas esse não é o caso dos países do hemisfério norte,
por exemplo. Sobre o histórico do AE:
Academia.edu is a social networking service founded in 2008 by Richard Price.
[...] As to the socio-economic layer, Academia.edu is a for-profit company with
headquarters in San Francisco. When posting, uploading, publishing,
submitting or transmitting member content, users grant Academia.edu a
worldwide, revocable, non-exclusive, transferable license to exercise any and
all rights under copyright. The platform’s business model is largely based on
provision of a wide range of free-of-charge services that are supplemented by
61
Revista Coletivo Cine-Fórum RECOCINE | v. 2 - n. 2 | mai-ago | 2024 | ISSN: 2966-0513 | Goiânia, Goiás
premium accounts, like enhanced analytics and a job board for advertising
academic vacancies (Manca, 2018, p. 4).
A bibliografia deu a entender que essa rede social é mais focada nas ciências humanas
e nas artes, enquanto seu concorrente direto, o ResearchGate, focaria-se mais nas ciências
naturais. Os dados apontam que o número de acessos e de usuários cadastrados variou ao longo
do tempo, o que abre discussões que saem do escopo do artigo sobre qual se adapta melhor à
cultura digital - podemos fazer essa comparação em relação ao CL, o objeto desse artigo.
A PL, em teoria, não é uma rede social, mas antes um mecanismo de gestão. Acerca
desse mecanismo, o que nos interessa mais especificamente é o CL, que é de acesso público
geral - para um público interessado em pesquisa. O cadastro de seu interesse, é claro, exige um
CPF, o que envolve uma base de dados do governo - que também prescinde que as informações
inseridas sejam regulares. No entanto, é possível aproximar a CL do conceito de redes sociais
por meio de um mecanismo interno do currículo, na figura 1:
Figura 1 - contato disponível para o pesquisador
Fonte: Plataforma Lattes.
Esse botão de “contato” permite o envio de uma mensagem direta entre os usuários, pois
quem dispara o email é a própria plataforma (para ocultar o endereço do pesquisador-alvo).
Além do mais, houve ocasiões em que os cientistas utilizaram o espaço dos seus CL para
mandar mensagens para além das credenciais acadêmicas, como quando houve o protesto
contra a fusão do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação com o das Comunicações, com
a hashtag #ficamtb (Dantas, 2016). Ou seja, do ponto de vista técnico, a única diferença
existente é que não é possível interagir com as postagens dentro da plataforma, porém essa
também é uma função que pode ser desabilitada dentro do AE.
Cumpre notar que o CL é um levantamento quantitativo, que só aponta para a existência
das ações, as quais devem ser comprovadas externamente pelo usuário - mormente em caso de
denúncias, pois a plataforma não recebe documentos para o CL. No começo, de 1993 a 1999,
os formulários eram feitos no DOS, com dificuldade de separar coautores (Lattes, 2001). Entre
1998 e 1999, foi feito um levantamento de como poderia ser um planejamento para gestão C&T,
inserindo mais funcionalidades e criando o Sistema de Currículos Lattes. Já nos anos 2000, foi
criada uma versão offline (que enviada os dados pelo CNPQ), seguido da:
62
Revista Coletivo Cine-Fórum RECOCINE | v. 2 - n. 2 | mai-ago | 2024 | ISSN: 2966-0513 | Goiânia, Goiás
[...] formação da Comunidade Virtual LMPL, que definiu o modelo DTD (Data
Type Definition) XML do Currículo Lattes, que faz parte da versão 1.4. Com o
mesmo, as universidades brasileiras podem agora extrair informações do
Currículo Lattes e/ou gerar informações para o mesmo a partir dos seus
sistemas corporativos. O projeto viabilizou a abertura da Plataforma Lattes, do
ponto de vista de conteúdo dos dados, e manteve inalterado o acesso técnico às
informações, preservando a segurança dos pesquisadores (Lattes, 2001, n.p).
Como podemos perceber, o esforço foi empregado na divulgação dos dados, o que
acabou colocando o uso para o público - em uma lógica de divulgação científica. Ou,
poderíamos dizer, de uma divulgação de títulos, para instigar a procura das publicações, em
uma lógica de divulgação científica.
Agora que ligamos o AE e o CL com o fenômeno Redes Sociais, podemos agora
investigar como chegaremos na representação em si, que é o principal objeto da
repraesentologia, por meio da representação de pesquisador.
REPRASONTOLOGIA, A HIPÓTESE E O PESQUISADOR
Nesta seção vamos estabelecer o referencial teórico e o conceito investigado para
abordar os fenômenos em tela. Vamos começar pelas representações e, posteriormente,
revisaremos o papel do pesquisador com o fito de estabelecer o que será contrastado com a
realidade empírica.
Adotamos a perspectiva da repraesontologia (enquanto ciência da representação) para a
abordagem do fenômeno, sob a perspectiva da Lopes (2023), com objetivo de contribuir para o
estudo da representação como um todo. Assim, nessa perspectiva, considera-se que pesquisador
é o referente e as representações são aquelas produzidas pelas redes sociais, por meio dos
avatares, que se constroem pela seleção de aspectos da realidade - afinal, sobre o pesquisador
não interessa dados como quantos filhos tem, programas de Televisão favoritos, etc. Assim,
uma ciência das representações pode dar conta de estudar como as representações se
constituem, partindo do seu conteúdo. O modelo que escolhemos para estudar essa
representação é chamado colcha esticada:
Quando se trata do assunto X (o referente), já vimos que a representação X=Y
guarda no seu interior uma percepção, mesmo que estereotipada, de outras
representações referentes a X, que é um reservatório de representações e que
não possuem eficácia simbólica para aquele indivíduo. No entanto, quando se
trata da comunicação [...] - o referente X se torna o atrator - aquele enigma a
ser desvendado e, consequentemente, definido pela representação - e isso gera
um entorno composto de diferentes representações, as quais tentam produzir a
significação final. Esse processo passa por demonstrar que as outras não são
63
Revista Coletivo Cine-Fórum RECOCINE | v. 2 - n. 2 | mai-ago | 2024 | ISSN: 2966-0513 | Goiânia, Goiás
verdadeiras por incompletude ou por imprecisão. [...] elas não são equivalentes,
apenas versam sobre o mesmo assunto (Lopes, 2023, p.83).
Assim, o AE e a PL estão interpretando e definindo o que é um pesquisador (X), ao
menos na construção de sua identidade digital, com o intuito de atrair o máximo de indivíduos
possíveis para a adesão. Dessa maneira, a definição mais “correta” vai atrair mais os
pesquisadores. O fato de haver convergências indica que existe uma certa dose de diálogo - por
exemplo, o PL, atualmente, permite que adicionemos autores em co-autoria e o mesmo recebe
uma notificação, enquanto anteriormente não havia a integração entre esses bancos, o
lançamento era puramente manual.
Dessa maneira, é possível se pensar que existe uma entorno, no qual essas
representações interagem. Além dessa dinâmica, podemos também estudar os elementos dessas
representações, ainda segundo Lopes (2023): a cognição (aqui fica evidente que a cognição se
expressa no conjunto de estímulos de luz, com imagens e letras), as limitações da mídia -
evidentemente, o contato com as mídias se limita à conexão com a internet, e também estão
limitadas pela presença de dispositivos e a informação não fica disponível facilmente.
Quadro 1 - conceitos da repraesontologia e descrição
Conceito
Descritor
Resíduo factual
A representação não se mantém se ela não for nutrida com fatos, então existe um substrato factual.
Percepção do outro
Existe uma noção mais ou menos desenvolvida de como será recebida a comunicação.
Diálogo
A representação pode ser reformulada (com maior ou menor radicalidade) na interação, e nesse
caso os outros indivíduos também trazem elementos para o resíduo factual ou trazem argumentos
de autoridade.
Fonte: adaptado de Lopes (2023)
Antes de partir propriamente para a representação, é importante entender o referente, no
caso o pesquisador - nota-se, a discussão fica até um pouco filosófica, na medida em que o
pesquisador está sendo lido fora de fronteiras geográficas, mais como um conceito. Assim, é
preciso realizar uma retomada de representações que foram recorrentes na dimensão histórica
por meio da revisão bibliográfica.
A pesquisa, em si, é uma atividade muito antiga, estando ligada com a investigação
com vistas a entender e explicar a realidade. É preciso, no entanto, não confundir tecnologia
com ciência, dado que a tecnologia não prescinde de conhecer a realidade, embora se beneficie
dela. A investigação antiga-medieval focava seu conhecimento na transcendência, na
metafísica. No entanto, a ciência moderna se foca no conhecimento da natureza, focando na
64
Revista Coletivo Cine-Fórum RECOCINE | v. 2 - n. 2 | mai-ago | 2024 | ISSN: 2966-0513 | Goiânia, Goiás
física. Posteriormente, a metafísica foi negada enquanto interesse principal, especialmente após
o giro linguístico, que enfocou o interesse na linguagem.
A ciência moderna acaba por institucionalizar isso pela figura da universidade (que
era uma instituição medieval), quando o pesquisador acaba sendo uma atividade por si mesma,
desfrutando de certa liberdade em conjunto com a docência (Rossato, 2011). Porém, a
instituição acabou passando por algumas reformas, as quais foram desafiando esse papel mais
“livre”. Assim, o pesquisador passa a ser apreciado não apenas pelo seu impacto intelectual
com os pares (ilustrado, parcialmente, pelas citações), mas também por uma medição para
avaliação de qualidade. Essa nova ordem fica explicitada pelo estudo de Caregnato et al (2021),
que demonstra que muito do prestígio dos pesquisadores decorre de sua ocupação de cargos de
gestão.
Poderíamos afirmar que o cume dessa dinâmica é o Processo de Bologna:
[...] ao denominado Processo de Bolonha e às consequências que trouxe para
as instituições de ensino superior da Comunidade Europeia. Constituindo um
marco preponderante na reforma das instituições de ensino da Europa, o
Processo de Bolonha traça como objectivos principais a edificação de um
Espaço Europeu de Ensino Superior que viabilize a internacionalização das
universidades, facilite a mobilidade de alunos e docentes, promova a
empregabilidade dos cidadãos europeus e concorra para o desenvolvimento
económico, social e humano da Europa , a consolidação e enriquecimento da
cidadania europeia e o aumento da competitividade com outros sistemas de
ensino do mundo (em particular os dos Estados Unidos e do Japão) (Morgado,
2009, p. 50).
Como podemos observar, existe uma busca de convergência entre os interesses da
sociedade e os recursos da universidade. Alguns autores afirmaram que isso seria uma união
entre universidade e mercado, por intermédio do então chamado neoliberalismo. Afora essa
discussão, poderíamos afirmar que existe uma concepção mais pragmática:
Essa nova concepção é marcada por uma lógica mais utilitária, na qual a
Universidade é pensada como um mecanismo de qualificação profissional
para atender às demandas do mercado. Portanto, o sentido de sua atuação é
atrelado a uma visão de mundo na qual o mercado coloca-se como centro
regulador da vida social, e o direito à Universidade é entendido como direito
de acesso a melhores posições no mercado (Lopes, 2019, p.82).
Assim, existe uma decomposição da atividade científica com fins de aferição: número
de produções, número de aulas, etc. Com base nisso, são feitas as análises de gestão, o que, de
certa forma, acaba por retirar a universidade de um plano separado, da sua Torre de Marfim -
muitos autores, inclusive, afirmam que essa reforma foi uma intervenção do mercado, e
consideram o AE como outra intervenção.
65
Revista Coletivo Cine-Fórum RECOCINE | v. 2 - n. 2 | mai-ago | 2024 | ISSN: 2966-0513 | Goiânia, Goiás
METODOLOGIA
A metodologia de estudo foi qualitativa, com enfoque na análise das redes sociais como
se fossem imagens e textos: eles expressam uma espécie de narrativa da trajetória sobre o
pesquisador por meio das variáveis que desenvolvem, sendo que ele conta essa história por
meio dos dados selecionados dele, por um processo de filtragem - afinal, o pesquisador está
atravessado por uma biografia pessoal, relações sociais, personalidade, etc.
Também selecionamos, para análise, as redes sociais no momento em que esse artigo
está sendo escrito, que é uma ocasião em que podemos analisar os dados com o máximo de
informações disponíveis - partindo do histórico, provavelmente o AE tenha alterações no
momento de publicação deste artigo, enquanto a PL provavelmente não.
Como as redes sociais estão hospedadas em sites da internet, possuímos bastante
material audiovisual para analisar, mas precisamos promover uma seleção para responder ao
nosso problema de pesquisa. Na prática, uma rede social é um cadastro, e para um cadastro é
importante selecionar dados relevantes para quem está colhendo a informação (Araújo, 2022).
Dessa maneira, selecionamos algumas variáveis que nos são úteis para a relação com o
referencial teórico, apresentado na seção anterior no quadro 2:
Quadro 2 - variáveis e descritores
Conceito da
Teoria
Variável
Descritor
Resíduo factual
Nome
Espaço para a colocação do nome do pesquisador, o que facilita para a fabricação
do nome citado
Instituição
A instituição de filiação do autor está explicitada?
Comprovação
Que mecanismos de verificação estão disponíveis?
Criação
Existe espaço para o usuário editar o seu perfil além da inserção de informações?
Percepção do
outro
Descrição
O autor pode postar um texto autoral?
Publicações
Como as publicações do autor são comunicadas para o público?
Co-autoria
Como o co-autor de uma publicação é codificado nela?
Indexação
De que maneira o conteúdo é codificado em palavras?
Acessos
Os números são disponibilizados para o usuário?
Diálogo
Convergência com
outras redes
É possível fazer o login por meio de outras redes sociais ou é possível acessar
outras redes?
Notificações
Em que ocasiões a plataforma se comunica, de maneira automatizada
Fonte: dados da pesquisa
66
Revista Coletivo Cine-Fórum RECOCINE | v. 2 - n. 2 | mai-ago | 2024 | ISSN: 2966-0513 | Goiânia, Goiás
No entanto, é preciso explicitar que as variáveis não vão ser recursos de análise, pois
empreendemos a estratégia de análise por via de uma análise de conteúdo (Bardin, 1977), na
busca de categorias - afinal, o conteúdo das representações é que podem nos levar a refletir
sobre as representações, é um caminho necessário. Essas variáveis foram avaliadas enquanto
categorias das duas representações possíveis, o que foi possibilitado pela avaliação de duas
mídias diferentes - o AE e a PL. O intuito desse procedimento foi o de coletar essas informações
e, na comparação, encontrar alguma dinâmica gerada.
DADOS DA PESQUISA
Podemos começar por uma comparação quantitativa do volume de modificações no site,
o que indica o quanto a interação desses com a sociedade usuária. A figura 1 foi obtida no
arquivo digital chamado de wayback machine, que felizmente abrangiu as inaugurações das
respectivas redes sociais, dado que elas são relativamente recentes:
Figura 1 - modificações promovidas no site academia.edu
Fonte: adaptado de https://web.archive.org/web/20230815000000*/https://www.academia.edu/
Consultado em 25 de mai. de 2023
Podemos observar que o site possui uma intensa modificação, com picos em 2013 e
2015 - este último inaugurando uma tendência de crescimento, com novo topo em 2022. As
modificações continuam até o ano corrente. Na figura 2, podemos
Figura 2 - modificações promovidas no site da plataforma lattes
Fonte: adaptado de https://web.archive.org/web/20230000000000*/https://lattes.cnpq.br/
Consultado em 25 de mai. de 2023
A figura evidencia que a plataforma é mais antiga do que o AE, porém ela possui um
número de intervenções bem menor e espaçada - por exemplo, sua inauguração contou com
pouquíssimas intervenções até o ano de 2004 - que pararam no ano de 2020. Essa análise mais
67
Revista Coletivo Cine-Fórum RECOCINE | v. 2 - n. 2 | mai-ago | 2024 | ISSN: 2966-0513 | Goiânia, Goiás
superficial indica, portanto, que o AE está mais inserido na lógica da liquidez, promovendo
mais modificações e inserções de recursos. Mas o que nos dizem os dados analisados em
profundidade?
NOME
Esta categoria é um tanto óbvia de estar em uma rede social, a uma primeira vista. No
entanto, em uma segunda mirada, vamos perceber que as diferenças aqui são capitais, pois elas
indicam que o site está se direcionando mais para um polo social ou para o polo da pesquisa.
A parte do registro do nome no academia.edu traz a expressão completa. Isso é evidente
porque há a pretensão de ser uma rede social, o que torna desejável registrar o nome do usuário
para muitas finalidades - o que não ocorre com o Lattes, cuja finalidade principal é a
accountability. Assim, o nome pode ser também escolhido com perfis falsos, pois não o CPF
trazendo um banco a ser comparado.
no currículo lattes, existe o nome que é batido com o CPF - sim, é possível inventar
um nome falso e modificar a foto, mas, em uma situação de auditoria é possível realizar
engenharia reversa e então encontrar o verdadeiro pelo CPF. Além do nome “civil”, existe
também o nome que é próprio dos pesquisadores: o de citado, que coloca o sobrenome na frente
do nome. Ora, esse nome é construído automaticamente pela plataforma, não permitindo que o
indivíduo nele exerça sua subjetividade - no máximo é possível variações - que é possível
escolher-se que componentes do nome se tornarão iniciais.
Mas esse é o nome, e quanto a instituição? Que lugar ela ocupa nesses sites?
INSTITUIÇÃO
A instituição é uma tônica da modernidade, pois estabelece uma impessoalidade em
atividades sociais. A instituição da universidade moderna, no caso, é um tipo especial, que
ela também concentra certa “esperança”, que é a questão da reflexividade. No caso de uma rede
social, os processos internos da instituição não interessam, mas antes uma imagem pública dela,
e funciona como um meta-dado.
No AE, a instituição atual é a mais importante, uma vez que ela é um dado para se
encontrar o próprio pesquisador. Nesse sentido, o foco é na instituição atual, pois ela permite a
vinculação com outros pesquisadores da mesma instituição, criando uma rede, que são possíveis
de serem encontrados pelo nome da instituição. Ou seja, é mais uma referência para encontrar
os usuários. Cabe ressaltar que a plataforma tamm está disponibilizando planos para
Instituições - que passam a ser usuários também e denota certo ímpeto de expansão do negócio
68
Revista Coletivo Cine-Fórum RECOCINE | v. 2 - n. 2 | mai-ago | 2024 | ISSN: 2966-0513 | Goiânia, Goiás
AE. na PL, a instituição funciona como um histórico profissional, pois coloca o pesquisador
dentro de uma sequência de vínculos, que servem também para atestar o seu círculo de
consagração (para utilizar a expressão de Bourdieu). Assim, automaticamente, ela serve como
mecanismo de accountabilty, e a ligação é importante também historicamente e do ponto de
vista burocrático.
Assim, há uma inversão: a instituição é o ponto central para o PL, enquanto é um valor
de referência para encontrar o usuário no AE. Ou seja, a instituição compõe o indivíduo em
uma e em outra o coloca dentro de um público-alvo. Mas voltando ao indivíduo, podemos
partir para sua auto-descrição.
DESCRIÇÃO
Nas duas plataformas existe um espaço próprio para que o usuário possa escrever a sua
biografia - enquanto pesquisador, obviamente. Como esse dado é relevante para os dados de
pesquisa? Afinal, esse é um espaço em que é possível exercer autoria, que a escolha das
informações e os elementos comunicacionais são de opção do autor.
No AE, esse espaço é completamente subjetivo, na medida em que o texto é livre - no
qual é possível anexar também hiper links e links abaixo do preço - além da foto. Nesse sentido,
podemos perceber que existe uma busca da convergência intencionalmente.
Quanto ao PL, ele tem a possibilidade de elaborar um texto automático - recurso
presente muito antes do Chat GPT, diga-se de passagem. Porém, existe uma restrição de
possibilidades que não ocorre com o AE, pois o texto vai de formatação limpa, sem estilização
ou ligações externas. Assim, existe certa sobriedade nesse pesquisador.
PUBLICAÇÕES
O CL com certeza não é mais resumido do que um Currículo Vitae na questão da
extensão, porém o volume de páginas, com certeza, é menor do que o conjunto de artigos escrito
por um pesquisador. E, assim, o modo como a existência do artigo é apresentado é um dado
relevante para pensar a representação do pesquisador.
O AE possui a proposta de disponibilizar a publicação de forma íntegra, sem ordem
temporal necessária - ou seja, é possível escolher a espontaneidade dos uploads sequenciais ou
é possível organizar as publicações por alguma outra ordem. Assim, a obra do autor está mais
sob seu controle, no sentido de que ele pode escolher que texto será feito primeiro - ou seja, o
foco não é na atualização, mas sim na obra, disponibilizando pelo título e pelo número de
visualizações.
69
Revista Coletivo Cine-Fórum RECOCINE | v. 2 - n. 2 | mai-ago | 2024 | ISSN: 2966-0513 | Goiânia, Goiás
na PL, as publicações são disponibilizadas em lista, colocadas na referência da
ABNT e com uma organização temporal, em uma lógica mais cumulativa. Ou seja, existe certa
exigência de constante atualização, enquanto o AE foca mais no impacto. Mas, e quando a
publicação é escrita por mais pessoas?
CO-AUTORIA
A co-autoria é o outro lado da moeda dos pares: existem os avaliadores que são pares,
mas existem também as pessoas que performam na escrita. Além desse trabalho de equipe,
também as questões de propriedade intelectual, então o co-autor precisa ser expresso no texto
final, até por questões jurídicas. E como isso ocorre?
O AE possui uma integração com outros perfis muito mais efetiva - porém com a
limitação de que pode ser amealhado quem está cadastrado na plataforma, o que também
diminui a possibilidade de erro com homônimos. Ou seja, para possuir uma autoria reconhecida,
é essencial o cadastro do autor, até para o compartilhamento das visualizações. Ou seja, a
existência está vinculada à presença no lugar.
no CL, a co-autoria é inserida manualmente via digitação, mas também não garante
uma ligação com outro perfil - afinal, nesse contexto, não o que ser dividido a não ser a
autoria do texto, enquanto no AE são divididas as visualizações. Assim, mais importante do
que a rede, aqui o mais importante é o registro da informação pura e simples, sem pensar as
redes no sentido de ligação, e essa é uma boa abertura para se pensar as convergências com
outras redes.
CONVERGÊNCIA COM OUTRAS REDES
As plataformas podem funcionar com um banco de dados normais ou podem ser
integrados com outros bancos de outras redes sociais. Do ponto de vista da divulgação, é
interessante que haja essa integração - embora elas abram brechas para a segurança. No entanto,
se a plataforma necessita do fluxo, é um risco que vale a pena ser corrido.
Essa última é a lógica do pesquisador do AE. Ele possui outros avatares, que são auto-
referentes e levam uns aos outros. Logo, o pesquisador está presente em múltiplas instâncias,
tornando-o produtor de conteúdo. Outra questão relevante é que na rede social Facebook, os
títulos das publicações no academia.edu aparecem enquanto texto, mas isso não se reproduz em
outras redes como o Linkedin e o que aparece ao usuário é apenas o link sem uma legenda, por
exemplo - o que reforça o argumento de que se trata de um pesquisador voltado para a
comunicação social.
70
Revista Coletivo Cine-Fórum RECOCINE | v. 2 - n. 2 | mai-ago | 2024 | ISSN: 2966-0513 | Goiânia, Goiás
na PL, é possível integração com uma outra rede, que é o ORCID, que atribui um
digito para cada perfil de cientista - embora esse não peça um CPF no momento do cadastro,
justamente por seu caráter internacional. Assim, é bem restrita a convergência, porém existem
algumas tentativas de facilitar esse compartilhamento - como a existência de um link curto.
Logo, existe uma tentativa de aproximação, ainda que engessada, com certa sociedade civil.
Como existe esse diálogo, podemos teorizar sobre a legitimidade das publicações,
novamente pensando no círculo de consagração. Assim, como se comprova as publicações?.
COMPROVAÇÃO
A própria ciência opera pelas evidências, que são a conexão empírica entre as mentes
dos pares. Logo, a publicação é a materialização desse esforço investigativo: para além de ser
um relatório, é também uma comunicação (ainda que mediada pelo conhecimento técnico).
Nesse caso, as instâncias de legitimação são distintas nas duas plataformas.
No AE, essa legitimidade acontece no termo de aceite: o pesquisador é o responsável
pela veracidade das informações prestadas - não é raro encontrar autores que fazem o upload
de obras clássicas, talvez por pensarem que a página é um repositório de textos, autorais ou não.
No caso da PL, a legitimidade é por força da legislação brasileira: prestar informações
falsas entraria no crime de estelionato (art. 171 da CF88). Porém, diferente do AE, não
inserção do arquivo, o que abre a possibilidade de se fazer uma falsificação do currículo, como
ocorreu com alguns pesquisadores brasileiros (Lopes, 2022). Assim, seria interessante descobrir
o desdobramento jurídico dessas supostas fraudes para entender as suas implicações na prática
de outros pesquisadores.
Como esta categoria está lidando diretamente com a legitimidade, ainda há o espaço de
como é feita a disponibilização da informação verdadeira. Vejamos porque esse é um dado tão
importante.
CRIAÇÃO
Com relação à criação, os recursos digitais permitem uma possibilidade de edição
constante, devido à codificação em ambientes virtuais. Nesse sentido, uma possibilidade é a
ordenação das categorias.
Por exemplo, o AE tem a possibilidade de edição do perfil - é possível criar categorias
como artigos, capítulos de livro, etc., inserir materiais nelas e ordená-las. A exceção são os
vídeos, cuja categoria é a primeira - provavelmente para concorrer com outras plataformas
como o YouTube ou o Instagram.
71
Revista Coletivo Cine-Fórum RECOCINE | v. 2 - n. 2 | mai-ago | 2024 | ISSN: 2966-0513 | Goiânia, Goiás
o CL possui categorias pré-fixadas e que não podem ser mudadas: textos completos
são colocados antes de capítulos de livros, que são colocados antes de resumos, etc. Assim, é
impossível trocar essa ordem, restando ao pesquisador a inserção mais burocrática - é possível
acrescentar uma estrela para destacar a produção, mas esse é o máximo de destaque
disponibilizado.
Assim, como referimos à criação, não como escapar dos termos que facilitam o
encontrar das informações. Vamos explicar também porque essa informação é relevante.
INDEXAÇÃO
Poderíamos afirmar, de maneira um tanto poética, que os termos são os atratores visuais,
verdadeiros redemoinhos no mar de informações da web. Eles são essenciais para se encontrar
algo em um motor de busca, e geralmente são distintos por um # (hashtag). Essa lógica é da
cultura digital, como se aplica a um campo de pesquisa, que utiliza palavras-chave?
O AE reproduz mais essa lógica científica, porém de uma maneira semelhante ao
hashtag: as palavras servem para outros motores de busca e, ao mesmo tempo, para
disponibilizar outras produções para quem está procurando. Assim, o pesquisador possui sua
obra “diluída” na internet.
Já no PL, as palavras-chave remetem à plataforma. Talvez se fosse possível acessar de
fora isso não fosse efetivo: seria primeiro preciso acessar o perfil do pesquisador para acessar
o registro, ele não está disponível fora desse formato. Porém, mesmo dentro da página, é difícil
encontrar palavras-chave - cumpre notar que, nas primeiras versões da plataforma era mais
simples, havia um campo apenas para isso. Ou seja, trata-se de um uso estritamente técnico,
feito entre os pares.
Há momentos, no entanto, em que a plataforma, precisa se comunicar com o usuário, e
isso também indica como o pesquisador deve ser abordado. Vamos observar os dois casos.
NOTIFICAÇÕES
O usuário interagir com a plataforma é uma maneira de mantê-lo conectado a ela. Dessa
maneira, se ele for alguém a ser acionado, significa que há uma necessidade do seu acesso. Se
não, uma indicação de um pesquisador que faz login para atualizar ou buscar outros
pesquisadores, sem um uso cotidiano.
O AE interage bastante com o usuário no envio de e-mails e com a criação de
notificações - o que pode chegar a ser considerado SPAM por parte de alguns usuários, uma vez
que muitas delas claramente procuram convencer o usuário a adquirir o plano premium. Novas
72
Revista Coletivo Cine-Fórum RECOCINE | v. 2 - n. 2 | mai-ago | 2024 | ISSN: 2966-0513 | Goiânia, Goiás
publicações de acordo com o interesse - é preciso manter o fluxo do pesquisador para a
plataforma.
a PL não interage com o usuário fora do login - as notificações também ficam listadas
abaixo do painel, o que não lhe confere destaque. Isso provavelmente se deve ao fato de que
esse currículo é também um documento, e ele serve mais para consulta do que propriamente
para uma divulgação da ciência.
Por referir ao acesso do usuário, será que se geram métricas do acesso dos outros
usuários?
ACESSOS
O fato de o pesquisador ter alguma noção de que modo sua produção é apropriada
remete a uma ideia de o pesquisador focar-se mais ou menos na produção do conhecimento.
Nesse sentido, conhecer essas concepções é essencial saber do público. O AE oferece métricas
do público que acessam o perfil de cada usuário. Apesar de o analitics mais completo ser da
versão premium, é possível baixar um banco CSV e analisá-lo via BrOffice. Ou seja, é possível
uma análise secundária gratuita para o pesquisador, desde que esse tenha instalado o aplicativo
correto. Isso que não mencionamos o número de visualizações para cada artigo e o número de
downloads - lembrando que o artigo fica embedado na página, e pode ser acessado sem precisar
guardar o ficheiro na memória do computador.
Já a PL não oferece muitas métricas - a exceção de uma série histórica de publicações,
e possibilita um espaço para que o pesquisador documente suas citações (as quais ele insere
manualmente). Assim, ele parece deixar o pesquisador concentrado apenas no trabalho
epistemológico - sem o feedback no front-end, embora exista o número sendo registrado no
ambiente back-end.
Com base nos dados analisados, podemos relacioná-los entre si e com o referencial
teórico mais amplo. Esse é o objetivo da próxima seção, que busca reconstruir as representações
por meio de considerações de caráter global.
CONSIDERAÇÕES GLOBAIS
Primeiramente podemos começar por uma visão mais ampla das evidências. Isso vai
permitir elencar as representações e, posteriormente, discutir as implicações para a
repraestonologia e depois concluir com discussões teóricas mais amplas.
Preliminarmente, fica evidente que o AE está mais focado no pesquisador em si, e pode
agir mais ativamente na aproximação dos mesmos. Assim, nota-se que existe uma convergência
73
Revista Coletivo Cine-Fórum RECOCINE | v. 2 - n. 2 | mai-ago | 2024 | ISSN: 2966-0513 | Goiânia, Goiás
com outras redes na questão da adoção de linguagens que geram o engajamento de usuários. Já
a PL aparece como mais focada no registro, o que inclui toda uma história institucional, que
sobrepõe o indivíduo, ou seja, o enfoque se no sistema educacional, sendo a comunicação
do indivíduo apenas uma questão de accountability.
A partir dessa apreciação primária, podemos considerar duas representações do cientista
a partir das categorias que foram elencadas:
(a) polemista/comunicador social em sentido restrito - o pesquisador deve estar inserido na
cultura digital, e seus artigos tornam-se conteúdo para serem acessados pelos demais indivíduos
- gerando-se métricas a partir desse acesso, com o qual ele pode lidar para poder gerar
redirecionamentos. Assim, a produção é avaliada qualitativamente por indivíduos de fora do
campo científico.
(b) institucionalizado - é o pesquisador que possui uma instituição cuidando de seu
reconhecimento social (ao menos na questão profissional). Assim, a produção do conhecimento
circula no interior do campo, se apresentando enquanto quantitativo para quem é de fora do
campo, em uma noção mais stricto senso.
Como podemos perceber, as representações não estão completamente separadas, dado
que alguns recursos interacionais estão compartilhados - evidentemente o AE é que tem mais
contato com as Tecnologias da Informação num geral, provavelmente por conta de seu
financiamento mercadológico. Complementarmente, não são representações que se anulam,
pois o vínculo entre as duas plataformas é possível. É claro que se poderia argumentar que, para
pesquisadores brasileiros, aderir ao Lattes é, de certa maneira, compulsório, pois sem esse
registro não é possível acessar seleções ou ser avaliado por IES. No entanto, o fato de haver a
criação desse avatar no AE indica que a compulsoriedade não anulou a vontade de fazer um
perfil - particularmente, o AE é muito útil para arquivar a produção.
Ambas lidam de maneira diferente com o círculo de consagração. Afinal, a PL está
consagrada pelas instituições - o AE utiliza o domínio .edu, mas não está ligada a nenhuma IES.
Dessa maneira, a última se baliza na democracia de acesso, enquanto a PL se legitima na ponta
de lança, produzindo o conhecimento “desinteressado” (afinal, o financiamento dela é público).
E é no AE (e em outras plataformas) que a pesquisa científica se torna conteúdo, o que é bom
e ruim. É positivo porque, de fato, o que é escrito pela academia pode circular pelo restante da
sociedade, mas é ruim também porque a pesquisa ainda necessita de um grau de instrução
técnico para ser compreendido, o que não é o caso das publicações voltadas para o público
acadêmico. Se por um lado, desmancha-se a torre de marfim, por outro existe a equiparação do
74
Revista Coletivo Cine-Fórum RECOCINE | v. 2 - n. 2 | mai-ago | 2024 | ISSN: 2966-0513 | Goiânia, Goiás
conhecimento acadêmico com outros produtos digitais não embasados, por conta da
necessidade permanente de se construir um branding (DUFFY, 2017).
Assim, o academia.edu traz de volta ao passado em um sentido e, enquanto em outro
traz o presente: por um lado, o pesquisador é avaliado por aquilo que escreve, sem
necessariamente a questão do cargo (afinal, um pesquisador iniciante pode ter mais seguidores
e visualizações do que um figurão consagrado); por outro lado, ele também é apreciado por
uma série de números e é rankeado por isso, tal como preconizado desde Bologna. Quando
apreciamos o CL por esse prisma, podemos perceber que Bologna foi ressignificada no Brasil
justamente pela preponderância do setor público na área da pesquisa.
A questão do AE de ser pago, por conta do plano premium, é que poderia ser um
problema em teoria, porém na prática não o é. Quando se navega por contas premium, o número
de seguidores e de visualizações é, de fato, muito alto, porém um passeio pelas visualizações
um parâmetro mais realista das visualizações: pesquisadores com 1000 seguidores, por
exemplo, não possuem mais de um artigo com mais de 3000 visualizações. Logo, o que o AE
faz, de fato, é promover o nome do pesquisador e relacionar os escritos com outros de interesse,
porém não cria as visualizações para as publicações.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente artigo lidou com a representação do pesquisador para duas plataformas, que,
na escolha das variáveis para montar seus bancos de dados, ajudam a montar uma representação
do que um deve ser. Para esse fim, realizamos uma discussão repraesontológica, abordando as
plataformas enquanto representações relacionais, investigando Resíduo factual, Percepção do
outro e Diálogo. Os resultados apontaram duas representações: o pesquisador comunicador
social e o institucionalizado, e suas relações estão bastante estabelecidas pelo processo de
Bologna e pela ascenção das TIs. Podemos concluir o texto com algumas reflexões finais.
A primeira é que devemos abandonar ou ressignificar a ideia de ciência do século XIX,
de que o cientista é alguém que sai da sociedade e da história para produzir conhecimento. Esse
tipo de escapismo não é necessário, o que caracteriza a ciência também é o seu poder de
comprovação e seu poder de crítica, para que se possa abastecer discussões mais amplas. Por
essa razão, o cientista deve alimentar o debate público, e não buscar determiná-lo.
Outra reflexão é que provavelmente não haveria o desenvolvimento de uma iniciativa
como o AE no Brasil por conta justamente do CL, que já faz uma função semelhante - embora
sem o recurso qualitativo de expor os escritos ou de permitir a criação de comunidades e de
75
Revista Coletivo Cine-Fórum RECOCINE | v. 2 - n. 2 | mai-ago | 2024 | ISSN: 2966-0513 | Goiânia, Goiás
vínculos, o que talvez não seja um interesse real do pesquisador brasileiro. Porém, mesmo que
a plataforma pública decidisse incorporar funções do AE, provavelmente não conseguiria ter
servidores para registrar as publicações. Poré, uma tentativa de disponibilizar o acesso
exigindo do autor uma URL do trabalho, mas que não é disponibilizado para a consulta pública.
Podemos encerrar com uma reflexão sobre a complexidade da mudança. Afinal, existe um
paradoxo que pode ser pensado pelo caso estudado: deve-se modificar uma estrutura em prol
das demandas sociais ou se deve insistir na mesma prática com o intuito de defender uma ideia,
elevando-a acima dos interesses imediatos? Existe o risco de, sem esse tipo de interação com o
letramento digital, o CL acabar se tornando um mecanismo de distinção? Esse parece ser uma
legítima questão humana e que deve ser investigado pelas ciências humanas no geral.
76
Revista Coletivo Cine-Fórum RECOCINE | v. 2 - n. 2 | mai-ago | 2024 | ISSN: 2966-0513 | Goiânia, Goiás
REFERÊNCIAS
ARAÚJO, Juliana Gonçalves de. E-recrutamento, seleção e redes sociais: uma análise das
redes sociais e sua influência sobre as práticas de recrutamento e seleção. Trabalho de
Conclusão de Curso (Bacharelado em Administração) - Instituto Federal de Educação, Ciência
e Tecnologia da Paraíba (IFPB), 2022.
BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977.
BARROS, D.; NEVES, C; SEABRA, F; MOREIRA, J.; HENRIQUES, S. Educação e
tecnologias: reflexão, inovação e práticas. Lisboa: [s..n.], 2011.
BAUDRILLARD, Jean. Simulacros e Simulação. Lisboa: Relógio D'água, 1991
CAREGNATO, Célia Elizabete; MIORANDO, Bernardo Sfredo; LOPES, Ricardo Cortez;
BEVILAQUA, Vinícius Folleto. Abordagem disposicional como ferramenta para compreender
o subcampo da Educação. Educação, v. 44, n. 1, 2021.
DANTAS, Carolina. Pesquisadores protestam na web por volta de Ministério da Ciência. 2016.
G1. Disponível em: https://g1.globo.com/ciencia-e-saude/noticia/2016/06/pesquisadores-
protestam-na-web-por-volta-de-ministerio-da-ciencia.html. Acesso em 29/05/2023.
DUFFY, Brooke Erin; POOLEY, Jefferson D. “Facebook for academics”: the convergence of
self-branding and social media logic on Academia. edu. Social media+ society, v. 3, n. 1, p.
2056305117696523, 2017.
LATTES, Curriculo. Histórico do Currículo Lattes. Plataforma Lattes. 2001. Disponível em:
https://web.archive.org/web/20011102024028/http://lattes.cnpq.br:8888/plataformalattes/inde
x.jsp. Acesso em 25/05/2023.
LOPES, Giseli Rabello. Avaliação e recomendação de colaborações em redes sociais
acadêmicas. Tese (doutorado) Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Programa de Pós-
Graduação em Computação, Porto Alegre, 2012.
LOPES, Ricardo Cortez. Currículo Lattes: um estudo sobre algumas representações sociais.
PragMATIZES-Revista Latino-Americana de Estudos em Cultura, v. 12, n. 22, p. 663-
694, 2022.
LOPES, Ricardo Cortez. Evasão e persistência de alunos de graduação da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul: um estudo moral das representações sociais. Tese (Doutorado
em Sociologia). Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Instituto de Filosofia e Ciências
Humanas. Programa de Pós-Graduação em Sociologia, Porto Alegre, 2019.
LOPES, Ricardo Cortez. Repraesontologia: fundamentos da ciência das representações. Porto
Alegre: Dialética, 2023 [Prelo]
MANCA, Stefania. ResearchGate and Academia. edu as networked socio-technical systems for
scholarly communication: A literature review. Research in Learning Technology, v. 26, 2018.
77
Revista Coletivo Cine-Fórum RECOCINE | v. 2 - n. 2 | mai-ago | 2024 | ISSN: 2966-0513 | Goiânia, Goiás
MORGADO, José Carlos. Processo de Bolonha e ensino superior num mundo globalizado.
Educação & Sociedade, v. 30, p. 37-62, 2009.
ROSSATO, R. Universidade Brasileira: novos paradigmas institucionais emergentes. In:
ISAIA, Silvia Maria de Aguiar. Qualidade da educação superior: a Universidade como
lugar de formação. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2011.