Revista Coletivo Cine-Fórum – RECOCINE
acurar o papel feminino. Segundo Hahner (1981, p. 14), as mulheres sempre foram desprezadas
na história da humanidade, pois:
Os homens, enquanto transmissores da cultura na sociedade, incluindo o
registro histórico, a ciência e as artes, veicularam aquilo que consideravam e
julgavam importante. Na medida em que as atividades das mulheres se
diferenciaram consideravelmente das suas, elas foram consideradas sem
significação e até indignas de menção. Por isso as mulheres permaneceram à
margem das principais relações do desenvolvimento histórico. Na medida em
que os historiadores, em geral, pertencentes ao sexo masculino, devotaram
seus maiores esforços à investigação da transmissão e exercício do poder, a
mulher continuava a ser basicamente ignorada.
A narrativa prossegue com o surgimento das três irmãs do rei no Palácio Real, que se
embruxaram à procura do “homem perfeito”. Representantes da antiga visão, ou seja, da
subalternidade patriarcal, elas exibem os efeitos colaterais da própria anulação identitária por
não lograrem a conjunção ideal de feminilidade e masculinidade, ambas asseveradas pelo
discurso patriarcal. No século XIX, o sofrimento psíquico ocasionado pela feminilidade e suas
exigências alcançou grande patamar nos estudos freudianos:
Neste conjunto de circunstâncias sociais, que teve como base o modo de vida
e o ideário burguês, a mulher foi subjugada a uma posição de “feminilidade”,
forjada pelo discurso masculino. Esta mesma “feminilidade”, entrando em
crise, ainda no século XIX, produziu a histeria como modo dominante de
expressão de um sofrimento psíquico. Diante da coerção a seu corpo, sua
sexualidade e sua vida, de modo geral, as mulheres encontraram, nos sintomas
histéricos, uma forma de dramatizar sua insatisfação e seu protesto.
(ALMEIDA, 2012, p. 31).
Orgulhosas e avarentas, as irmãs lançam uma maldição à princesa Juliana, ainda bebê,
ao afirmarem que ela também nunca se casará, deixando o rei, moldado por ingenuidade, em
grande aflição. O anúncio, para além do fantástico, antevê a maldição do mundo real, modelado
pela histeria da feminilidade.
De bebê à maioridade, a narrativa sofre um lapso de tempo, convergindo para o ponto
principal da estória: o momento de se casar. Diante de muita comemoração, muitos rapazes,
cuja beleza, inteligência e nobreza eram indubitáveis, foram apresentados à Juliana. Com
simpatia e admiração, a princesa dispensava todos os convites. Diferentemente das insinuações
das irmãs do rei, que buscavam a perfeição acurada que convergisse com a arbitrariedade do
feminino, a personagem buscava transformação do amor, conforme identificado no excerto
abaixo:
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RECOCINE, v. 1. n. 3 | set-dez | 2023 | Goiânia, Goiás