RECOCINE | v. 2 - n. 1 | jan-abr | 2024 | ISSN: 2966-0513  
Talita Ferreira Gomes da Silva  
https://orcid.org/0000-0003-1750-999X  
Mestranda em Estudos Literários pelo Programa de Pós-Graduação em  
Letras da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Pós-graduada em  
Revisão Textual pela Faculdade Iguaçu. Pós-graduanda em Educação,  
Gêneros e Sexualidade. Graduada em Letras: Português pela Universidade  
Federal de Juiz de Fora (UFJF). Profissionalmente, atua como  
Coordenadora Editorial do portal de notícias Seu Crédito Digital.  
Master's student in Literary Studies from the Postgraduate Program in  
Literature at the Federal University of Juiz de Fora (UFJF). Postgraduate  
in Textual Review from Faculdade Iguaçu. Postgraduate student in  
Education, Gender and Sexuality. Graduated in Literature: Portuguese  
from the Federal University of Juiz de Fora (UFJF). Professionally, she  
works as Editorial Coordinator of the news portal Seu Crédito Digital.  
Este artigo passou por avaliação por pares cega e software anti-plágio.  
LICENÇA ATRIBUIÇÃO NÃO COMERCIAL 4.0 INTERNACIONAL CREATIVE COMMONS CC BY-NC  
“É FODA?”: A REPRESENTAÇÃO DA MULHER NA  
PORNOGRAFIA  
RESUMO  
O consumo de pornografia ainda é uma área misteriosa e pouquíssimo explorada. Grande parte  
desse “desinteresse” parece estar atribuído à imagem moral da pornografia, fortemente ligada  
às concepções ocidentais e cristãs da sexualidade. Através de uma outra ótica, percebe-se que  
as relações de consumo são determinantes para a sociedade e, portanto, também influenciam  
diretamente tudo o que é produzido: dentre eles a pornografia. Trata-se de uma questão ampla,  
ligada ao desejo, à aceitação, à autoprojeção e, também, à expressão cultural do sujeito. A partir  
dessas relações entre os estudos sobre a sexualidade, consumo e pornografia é que se  
desenvolveu o presente artigo. Pretende-se compreender quais as diferenças na representação  
entre mulheres e homens em produções audiovisuais pornográficas, relacionar a crítica  
feminista com o surgimento do cinema e, por fim, questionar se a tentativa de mudança através  
da pornografia feminista seria suficiente para modificar algumas relações de representação das  
mulheres. Tem-se como problema de pesquisa o questionamento se mulheres desempenham o  
papel de sujeito ou mero objeto do sexo nas produções pornográficas, se o corpo feminino  
assume uma condição pública e, ainda, de que forma o que é representado na pornografia  
reproduz ou direciona o que acontece nas relações humanas e seus sistemas sociais. Por fim,  
admite-se que as respostas aos problemas vão além do alcance deste artigo, porém tem-se como  
objetivo principal levantar uma temática latente, ainda que pouco explorada pelo campo dos  
estudos de gênero, sexualidade e feminismo.  
Palavras-chave: Mulheres. Pornografia. Representação.  
“IS IT FUCK?”: THE REPRESENTATION OF WOMEN IN  
PORNOGRAPHY  
ABSTRACT  
Pornography consumption is still a mysterious and little explored area. Much of this  
“disinterest” seems to be attributed to the moral image of pornography, strongly linked to  
Western and Christian conceptions of sexuality. From another perspective, it is clear that  
consumer relations are decisive for society and, therefore, also directly influence everything  
that is produced: among them pornography. This is a broad issue, linked to desire, acceptance,  
self-projection and also the subject's cultural expression. This article was developed based on  
these relationships between studies on sexuality, consumption and pornography. The aim is to  
understand the differences in representation between women and men in pornographic  
audiovisual productions, relate feminist criticism to the emergence of cinema and, finally,  
question whether the attempt at change through feminist pornography would be sufficient to  
modify some relations of representation. of the women. The research problem is the question  
whether women play the role of subject or mere object of sex in pornographic productions,  
whether the female body assumes a public condition and, also, how what is represented in  
pornography reproduces or directs what happens in human relationships and their social  
systems. Finally, it is admitted that the answers to the problems go beyond the scope of this  
article, however the main objective is to raise a latent theme, although little explored in the field  
of gender, sexuality and feminism studies.  
Keywords: Women. Pornography. Representation.  
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O SURGIMENTO DA PORNOGRAFIA  
A palavra “pornografia” tem origem no grego, “pornographos”, que significa “escritos  
sobre prostitutas” (Hunt, 2000). Tem-se que algumas formas de sexualidade eram vinculadas à  
divindades, como no Egito, em que sacerdotisas recebiam presentes em troca de favores  
sexuais. Ainda existe a ideia de que na Grécia, mulheres trabalhadoras sexuais eram vistas como  
a encarnação de Afrodite e respeitadas por evocarem o amor, o êxtase e a fertilidade (Ceccarelli,  
2008).  
Para além dessa significação, a palavra “pornografia” também teria sua origem atrelada  
ao nome de uma coleção encontrada no século XIX por arqueólogos nas ruínas de Pompéia.  
Essa coleção era formada por imagens e objetos sexuais que à época eram considerados obras  
obscenas, cuja circulação era vetada para visualização de homens da elite, considerados  
“cultos” (Ceccarelli, 2008).  
O museu de Nápoles, então, criou uma área destinada exclusivamente para a coleção,  
sendo essa, a princípio, denominada como “gabinete de objetos obscenos”. Pouco tempo depois  
a denominação foi mudada para “gabinete de objetos reservados” e, em 1860, passou a ser  
chamada de “coleção pornográfica” (Ceccarelli, 2008).  
Portanto, observa-se que a pornografia, assim como a representação social da prostituta,  
embora andem juntas, recebem leituras diferentes ou opostas segundo a cultura. Em algumas  
sociedades, nas quais a noção de propriedade privada, monogamia e sexualidade são distintas  
do modelo ocidental, o sexo e, por consequência, o trabalho sexual, são encarados de forma  
totalmente diferente (Ceccarelli, 2008).  
A prostituição na Antiguidade, bem como suas representações, nunca tiveram a  
conotação pejorativa e moralista com a qual passaram a ser tratadas no Ocidente, com sistema  
de valores sustentado pela moral judaico-cristã (Ceccarelli, 2008).  
Portanto, a partir da etimologia da palavra “pornografia” pode-se inferir que se remete  
a uma experiência privada, oculta e ligada à curiosidade, com a figura da mulher tendo um  
papel protagonista, ainda que não como sujeito da ação.  
PORNÔ OU ERÓTICO?  
A compreensão das diferenciações entre “erotismo” e “pornografia” não é consenso.  
Neste artigo, pretende-se estabelecer um pressuposto que permita uma análise que se afaste dos  
critérios morais de avaliação para o estabelecimento teórico de ambos. Existe, no entanto, uma  
grande discussão sobre o uso dos termos, defendendo-se, por vezes, o uso distinto deles ou a  
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ideia de que a diferenciação não é necessária. Observa-se que dentre as posições em que a  
distinção é defendida, os critérios de julgamento têm ligação com a moral e sua influência.  
Vê-se também posições que defendem a diferenciação dos termos como uma forma de  
elitizar a representação sexual. Isso porque a pornografia seria diferente do erotismo somente  
pelos veículos de publicação. Leite Júnior (2006) afirma que tentativas frequentes de diferenciar  
esses dois conceitos demonstram esforços para legitimar expressões culturais em detrimento de  
outras, hierarquizando as diferenças entre elas.  
Segundo Baudrillard (1992), a pornografia é cacracterizada pelo “hiper-real”, que  
revela, de forma semelhante à ótica microscópica, detalhes das cenas sexuais. Para o sociólogo,  
o ato de "mostrar" atende ao desejo voyeurístico pela exatidão, esgotando-se em si mesmo e  
desvelando minuciosamente a nudez e a sexualidade, eliminando a aura de segredo, imaginário  
e ilusão que cercam o erotismo.  
Seguindo a linha de teóricos que têm o “pornográfico” como algo negativo, Barthes  
(1984) faz distinção entre o desejo “pesado” da pornografia e o desejo “leve” do erotismo.  
Nessa perspectiva, há caráter deturpador do pornográfico sobre o erótico.  
Para Bataille (2013), o erótico, assumindo caráter metafísico, tem fundamento na  
experiência de busca entre corpos opostos. Numa ideia de completude entre o “masculino” e  
“feminino”, o autor conceitua que o erotismo é a descontinuidade entre um ser e outro. Vale  
ressaltar que ainda sendo as definições do autor significativamente importantes para a  
compreensão teórica das relações entre erotismo e pornografia, trata-se de entendimento  
ultrapassado, vez que ainda mantém a ideia da superioridade “erótica” e polarização entre  
homens e mulheres, conservando uma ideia de “passividade” versus “atividade”, dominantes  
versus dominado.  
Perspectivas distintas dos teóricos até então representados, que argumentam pelo  
erotismo sendo diferente ou superior ao pornográfico, são apresentadas por Hunt (2000), Sontag  
(1987), Moraes e Lapeiz (1985) e Maingueneau (2010).  
De acordo com Lynn Hunt (2000), o termo "pornografia" trata-se de inovação moderna,  
que surge para distinguir entre o que é permitido e o que deve permanecer oculto devido à sua  
natureza prejudicial à moral e aos padrões éticos. A partir desse ponto, o erotismo passou a  
representar uma versão mais delicada da expressão do desejo nas artes e na literatura, enquanto  
à pornografia coube a representação degradante e suja do desejo humano, abarcando aquilo que  
os indivíduos tendem a sentir vergonha e que, segundo as normas estabelecidas, são submetidos.  
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Para Susan Sontag, há que se reinterpretar essa visão condenatória. A autora se opõe à  
noção de que a pornografia seja um problema cultural. Sontag (1987) aborda a pornografia no  
contexto das artes, defendendo que há obras pornográficas relevantes, que apontam para novas  
possibilidades estéticas. Para ela, no entanto, o valor literário dessas obras ainda não foi  
devidamente avaliado, o que acaba por emprestar à palavra conotação pejorativa.  
Como observado acima, a palavra “pornografia” tem sua origem ligada ao termo grego  
“pornographos” e, na sua concepção original, refere-se aos costumes, à descrição da vida, dos  
hábitos das prostitutas e de sua relação com os clientes.  
O “erotismo”, por sua vez, surge como referência ao deus grego Eros, que simboliza a  
paixão, o amor e a sensualidade latente (Hunt, 2000). Apesar de ambos os conceitos estarem  
ligados à sexualidade, ao uso do corpo e às práticas sexuais, considera-se que o erótico é  
associado a uma representação velada, sutil e sugerida, enquanto a pornografia seria óbvia,  
carnal e evidente.  
Existe, no entanto, uma grande discussão sobre o uso dos termos, defendendo-se, por  
vezes, o uso distinto deles ou a ideia de que a diferenciação não é necessária. Observa-se que  
dentre as posições em que a distinção é defendida, os critérios de julgamento têm ligação com  
a moral e sua influência.  
Questiona-se, no presente artigo, o que constituiria um vídeo pornográfico e o que  
constituiria, por exemplo, uma revista ou livro erótico. Tem-se como exemplo o filme “Azul é  
a cor mais quente”, em que há a representação de diversas cenas de sexo entre as protagonistas,  
mas que ainda assim não é considerado pornográfico. Demonstra-se, de certa forma, que a  
pornografia e o erotismo não teriam diferenciação ligada ao conteúdo, mas ao local e ao modo  
como são veiculados.  
Para Moraes e Lapeiz (1985, p. 11):  
Sabe-se muito bem que aquilo que uns consideram pornográfico não o é para  
outros, e aí pesam não só as diferenças históricas, étnicas ou culturais, mas  
também as subjetivas e individuais. A variabilidade dos critérios que julgam  
se uma obra é ou não pornográfica é tão grande que além da referência geral  
à sexualidade, pouco mais pode-se dizer deles. Vários livros que hoje são  
considerados clássicos da literatura, outrora foram acusados de obscenos e  
proibidos sumariamente.  
Por fim, segundo Maingueneau (2010), a definição de erotismo não é tão simples.  
Segundo o autor, as definições de “erotismo”, “obscenidade” e “pornografia” se entrelaçam em  
zonas semânticas de intersecção discursiva, chegando a ser, por vezes, considerados como  
sinônimos, o que torna complicado categorizá-los de forma rígida, o que também reflete na  
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definição dos gêneros literários atrelados a esses conceitos. Esse fenômeno de “imprecisão  
teórica” ocorre em função de uma valorização cultural atribuída à noção de erótico, que se  
encontra oculto e velado na tradição ocidental, enquanto os significados atribuídos ao  
pornográfico tendem a ser explícitos, gráficos e escatológicos.  
Dessa maneira, cada um desses conceitos se depara com a rejeição ao outro, no entanto,  
consenso é que as discussões, atualmente, reconhecem a importância do pornográfico na  
consideração do erótico. Tomar ciência das barreiras teóricas é necessário, a fim de que não se  
tenha pretensão de postular os limites entre ambos, restando concordar somente que não são  
conceitos opostos menos ainda superiores um ao outro.  
Na sequência, tem-se como objeto de análise o corpo erótico na literatura - um corpo  
que se afasta do aspecto puramente biológico e é atravessado por fluxos e afetos,  
incessantemente ansiando pelo outro, na suspensão do “racional” e entrega ao “emocional”  
(Bataille, 2013). Para Jean Laplanche (1994), no ser humano, diferenciam-se dois corpos: o  
“biológico” e o “erótico”, sendo o último a “colonização subversiva erótica do corpo biológico,  
subvertendo a função pela pulsão”.  
Deleuze (2017, p. 240) defende que “a estrutura de um corpo é a composição de suas  
conexões. O que um corpo é capaz está relacionado com a natureza e os limites de sua  
capacidade de ser afetado". Segundo Emanuele Coccia (2020), “cada ser vivo é uma legião.  
Cada um costura corpos e ‘eus’ como um alfaiate”.  
Neste ponto, introduz-se a experiência da pele como ferramenta da relação entre o  
“interior” e o “exterior”. Conforme Nancy (2017), o toque no corpo erótico é simultaneamente  
uma ação e uma reação. “Tocar agita e faz mexer, [...] age e reage ao mesmo tempo, [...] atrai  
e rejeita” (Nancy, 2017, p. 16). O corpo se converte em desejo. O “coração não bate mais no  
ritmo de uma bomba sanguínea, mas no ritmo frenético do desvario” (Nancy, 2015, p. 28).  
Deleuze defende, ainda, que essa modalidade de erotismo implica na dissolução das  
fronteiras corporais entre os indivíduos envolvidos. Segundo o filósofo, os corpos eróticos se  
conectam. “Insensíveis ou bruscas, na conexão que caracteriza um corpo são também  
constatáveis no seu poder de ser afetado, como se poder e conexão gozassem de uma margem,  
de um limite, no qual se formam e deformam” (Deleuze, 2002, p. 246-247).  
Segundo Foucault, essa é uma das experiências da sexualidade, quando a relação entre  
os corpos eróticos “[...] suscitou um de seus princípios internos de funcionamento mais  
essenciais: o desejo do sexo desejo de tê-lo, de aceder a ele, de descobri-lo, liberá-lo,  
articulá-lo em discurso, formulá-lo em verdade” (Foucault, 1999, p. 145-146).  
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Fica evidente, portanto, que o corpo erótico tem o potencial de conferir um novo  
significado ao sujeito, estendendo-se para além de sua materialidade. Isso implica que o corpo  
pode ser afetado pelas experiências eróticas que têm o poder de transformá-lo. Logo, a  
compreensão do corpo erótico transcende as fronteiras da materialidade e explora suas  
dimensões afetivas, transformações e interações. O corpo não é apenas uma entidade biológica,  
mas também um local que projeta significado, identidade e expressão.  
AS REPRESENTAÇÕES DO HOMEM E DA MULHER NA PORNOGRAFIA  
Não passa despercebida a diferença entre as representações de homens e mulheres na  
pornografia. Cabe ressaltar que, neste artigo, tratamos do recorte da representação da categoria  
numa análise “macro”, que trata de homens e mulheres cisgêneros e heterossexuais, como uma  
categoria ampla e com poucos recortes específicos de raça, sexualidade e outros.  
Inicia-se a reflexão através da exposição visual dos corpos através da pornografia. Vê-  
se que enquanto o corpo das mulheres comumente é exposto complementamente, nem sempre  
os homens têm seus corpos demonstrados. Essa nudez parcial conduz a crer que o corpo  
masculino ainda não tem a mesma adesão do que o corpo feminino, percepção ligada ao público  
que mais consome as produções pornográficas.  
Em vez de vermos imagens do desejo feminino ou que atendem ao desejo  
feminino, vemos simulações em manequins vivas, forçadas a contorções e  
caretas, imobilizadas em posições desconfortáveis sobre holofotes, quadros  
profissionais que revelam pouco sobre a sexualidade feminina (Wolf, 1992, p.  
179).  
Segundo Chiland (2005), a pornografia é um motor que enaltece a posição viril da  
masculinidade enquanto oferece a representação submissa da feminilidade. Tem-se como base  
a teoria do jogo de poder de Foucault (1999), que exemplifica a visão da mulher exclusivamente  
como fonte passiva de prazer masculino.  
Com retratações, em maioria, que apresentam a mulher como um objeto ausente de  
consentimento, o prazer feminino é sobreposto em razão da objetificação masculina (Wolf,  
1992).  
Oferecendo sexualidade como mercadoria embalada sob forma discursiva,  
possibilita a liberação catártica (em sentido amplo) das fantasias (reprimidas  
ou não) de seus consumidores mentes e corpos libertinos, liberais, libertários  
ou moralistas , transformando seus fetiches em desejo ou seus desejos em  
fetiches. Há para todos os gostos e apetites (Abreu, 2012, p. 49).  
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O olhar masculino projeta fantasias na figura feminina. Mulheres, nesse contexto, são  
olhadas e exibidas, tendo sua representação codificada para emitir impactos visuais de forma  
que se reforce a condição “para ser olhada” (Mulvey, 1995).  
Para Díaz-Benítez (2009), a pornografia ressalta, simultaneamente, uma tentativa de  
representação verídica e espetacular. A cena deve parecer real, mas ao mesmo tempo fugir do  
lugar comum. É estabelecido uma espécie de pacto narrativo para que o consumidor se  
autoprojete no material, mas tenha acesso a algo além do convencional, que espetacularize as  
práticas. Ou seja, o sexo na pornografia precisa ter fundo realista, mas é consumido também  
por não ser.  
Ao representar a transgressão social, além de uma espécie de hiper-realismo,  
a linguagem obscena cria o fetiche de certos vocábulos relacionados ao sexo.  
Ao representar uma parte do corpo, algumas palavras adquirem o status de  
fetiche. Em consequência,  
a
ênfase no realismo transforma-se,  
paradoxalmente, em uma forma grotesca, os falos são sempre imensos, as  
vaginas multiplicam-se e o ato sexual é uma espécie de frenesi improvável.  
Isso resulta em uma pornografia imaginária e, às vezes, fantástica, ainda que  
seus efeitos sejam bastante reais (Hunt, 2000, p. 39).  
Para além do lugar de submissão simbólico, mas também físico e visual nas cenas,  
existe, ainda, o conceito de “sadomasoquismo da beleza”, de Wolf (1992), o qual explica que  
mulheres, por mais independentes que sejam, só serão sexualmente desejadas se forem  
submissas.  
A pornografia, dessa forma, serve como um reforço de estereótipos de gênero, criando  
e sendo criada, concomitantemente, por padrões de sexualidade que normalizam a submissão  
feminina desde a representação do corpo (Butler, 2015).  
O CINEMA, A PORNOGRAFIA FEMINISTA E A TENTATIVA DE MUDANÇA DAS  
REPRESENTAÇÕES FEMININAS  
O cinema tem sua origem em um momento crucial para a cultura ocidental. No final do  
século XIX, o mundo passava por significativas transformações políticas, econômicas e sociais  
com a Revolução Industrial e o surgimento da classe burguesa. As relações humanas se  
reorganizavam e, para facilitar o processo de ascendência e acumulação de capital, a burguesia  
desenvolveu um universo cultural à sua imagem, de forma que permanecesse um processo de  
dominação ideológica, estética e cultural (Mascarello, 2006).  
Com a Revolução Francesa, entraram em pauta discursos que ampliaram o consumo  
para as camadas trabalhadoras. Fazia-se necessário, portanto, demarcar a diferença entre os  
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gêneros e classes na vida política e social, o que pode ser percebido também na narrativa da  
pornografia (Lauretis, 1994).  
A representação da mulher como espetáculo, ou seja, um corpo para ser olhado como  
objeto de desejo, de forma profundamente disseminada na cultura, encontra no cinema a sua  
expressão mais complexa (Lauretis, 1994).  
Surge, então, na década de 1970, a crítica feminista ao cinema, que se propôs a discutir  
qual seria a posição das mulheres nos filmes, principalmente nas produções clássicas. Percebeu-  
se que a mulher ocupava papel secundário, nunca como sujeito da narrativa e, geralmente, como  
objeto do olhar masculino (Mulvey, 1995).  
A crítica feminista buscava discutir como os estereótipos impostos às mulheres  
funcionavam como uma forma de opressão, uma vez que, ao transformá-las em objeto  
endereçado ao público masculino, havia o silenciamento do seu papel enquanto sujeito,  
anulando ou, pelo menos, atenuando seu papel social.  
Não é surpreendente que dentre essas críticas tenha surgido o debate sobre as  
representações ligadas à pornografia. Piscitelli (2005) explica que entre os anos 1970 e 1980  
nos Estados Unidos houve a “Feminist Sex Wars” entre correntes feministas antagônicas sobre  
a pornografia. O embate era composto por feministas radicais que entendiam a pornografia  
como fonte de opressão feminina e feministas liberais, que a entendiam como fonte de prazer  
feminino com potencial pouco explorado.  
Nesse contexto, ainda nos anos 1980, surgiram os primeiros filmes intitulados de  
“pornografia feminista”, que tinham objetivo de serem uma alternativa à pornografia  
mainstream. Não havia uma definição de regras para que os filmes fossem encaixados nesse  
gênero, tampouco uma preocupação com o cunho político do termo. A indicação era de que  
fossem filmes feitos por mulheres, que negassem a representação rotineira da mulher na  
pornografia.  
Questiona-se, no entanto, quais os sentidos atribuídos ao adjetivo “feminista” quando  
se fala em “pornografia feminista”. Além disso, põe-se em análise quais as características do  
gênero o fazem diferente das produções tradicionais. Faz-se necessária a diferenciação entre  
produtos “feministas” e produtos feitos por mulheres, visto que não necessariamente são  
sinônimos.  
Há que se questionar se existe, de fato, uma pornografia feminista, uma vez que o  
público consumidor ainda se mostra majoritariamente masculino e heterossexual. É o que se  
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observa através de entrevista com a pioneira do gênero, Erika Lust, que assume que suas  
produções ainda são majoritariamente consumidas por homens.  
Isabelle Lima | Quem mais vê seus filmes? Homens ou mulheres? De que  
regiões do mundo e faixa etária?  
Erika Lust | Meu público é composto por aproximadamente 60% de homens e  
40% de mulheres, principalmente dos Estados Unidos, Reino Unido e  
Alemanha (Lima, 2022).  
CONCLUSÃO  
O objetivo do presente artigo foi direcionado pela questão se a pornografia feminista  
representa ou não uma alternativa à pornografia mainstream, ou se é, somente, uma nova  
roupagem para as mesmas formas de representação feminina.  
Para além de uma visão moral cristã da questão, sabe-se que as relações de consumo são  
direcionadores sociais que interferem, inclusive, nas relações humanas, dentre elas a  
representação da mulher na pornografia. Não é o objetivo que haja uma revolução no gênero  
quando se tem como base as relações econômicas dentro do capital, profundamente ditadas pela  
dominação masculina e patriarcal.  
Conclui-se, portanto, que não há relações simétricas de gênero na pornografia feminista,  
ainda que numa tentativa de representação diferente, enquanto o que estiver sendo produzido  
não atender aos critérios de emancipação feminina, principal objetivo do movimento feminista.  
Por fim, através do estudo das definições históricas e conflitantes dos conceitos de  
“erotismo” e “pornografia”, assim como da complexidade de se definir justamente esses termos,  
a pesquisa almejou tratar da pele como condutora da experiência erótica, principalmente através  
da relação entre o “dentro e fora” apresentada por Jean-Luc Nancy.  
A diferenciação semântica e cultural dos termos “erotismo” e “pornografia” foi  
discutida de maneira a destacar sua relação, bem como afastar as ideias de avaliação crítica e  
moral ocidental. Defendeu-se que as fronteiras entre os conceitos não devem ser rígidas, mas  
sim fluidas e entendidas de maneira complementar.  
O conceito de corpo-erótico revelou que se trata da experiência erótica do corpo, o que  
transcende a dimensão biológica e amplia seus sentidos também para a inclusão dos afetos e  
desejos. A análise do dentro e fora da pele, não somente na sua dimensão física, permite reforçar  
a perspectiva de que ela atua como mediadora das interações eróticas.  
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